DESPESAS COM EDUCAÇÃO É INVESTIMENTO.
Terça-feira (10), a CNTE participou da audiência pública na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, que debateu o Sistema Nacional de Educação (SNE), tratado em projeto de lei complementar (PLP 25/19). O pedido para realização da audiência é de autoria da deputada Professora Rosa Neide (PT-MT).
O secretário de assuntos educacionais da CNTE, Gilmar Ferreira, levantou diversos aspectos em relação à regulamentação do artigo 23 da Constituição Federal de 1988: "É verdade que já são mais de 30 anos e em termos de legislação muito avançamos. Mas em termos de práticas do que foi legislado ainda há muitas brechas que possibilitam a disputa pelos recursos da educação, cortes e a sua aplicação como está previsto", ressalta.
Gilmar Ferreira abriu sua intervenção descrevendo duas imagens contraditórias que o deixaram inquieto nos últimos dias. "A primeira é sobre a estudante de Cocal dos Alves, exibida em uma reportagem do Fantástico sobre o corte nas bolsas de estudos de ensino médio, no valor de 100 reais, e de 400 reais para quem avança e vai cursar uma faculdade. Em que pese o corte das bolsas se referir ao corte dos alunos de ciência e tecnologia, aquela jovem moradora da zona rural, alimenta um sonho raro para os tempos atuais: ela quer ser professora". Para Ferreira,os jovens estão perdendo acesso ao ensino superior não por falta de esforço das famílias, mas por questões financeiras, pelo corte de bolsas.
A segunda imagem citada por Ferreira é a do nosso atual Ministro da Educação que, diante de estudantes recebendo uma premiação "afirmou categoricamente que os mesmos não representavam alunos do Brasil inteiro pois o país não tem lugar para todos, só para os melhores". Para Gilmar Ferreira, é uma defesa direta da meritocracia, da premiação, sinalizando que o repasse de recursos para educação se dê em função da competição e de resultados: "Com certeza esse não foi o espírito da constituinte em 1987 e 1988, ao estabelecer o artigo 23 da CF/88", reflete.
Sobre o PLP 25/19
O Projeto de Lei Complementar (PLP) 25/19 regulamenta a criação do Sistema Nacional de Educação (SNE), conforme prevê o Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/14 - PNE). De acordo com o PNE, o poder público fica obrigado a criar o SNE, por meio de lei específica, em até dois anos da data de publicação do plano. A proposta institui o Sistema Nacional de Educação (SNE), com normas para cooperação entre União, estados e municípios em políticas, programas e ações educacionais. O texto, da deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), tramita na Câmara dos Deputados.
O mestre em educação Carlos Abicalil - ex-presidente da CNTE e ex-deputado federal - também participou da audiência pública e destacou que um Sistema Nacional de Educação deve manter o "caráter democrático e popular capaz de se construir num pilar de sustentação de um Brasil justo desenvolvido e igualitário".
Abicalil fez um breve relato histórico de construção dessa legislação: "Tenho a grata felicidade de ser o autor da Emenda Constitucional 59, que alterou, no artigo 23, as leis complementares em plural em função de que um dos argumentos para não regulamentar a cooperação federativa era exatamente o tamanho da complexidade das linhas de ação do governo, que deveriam estar contempladas numa única formulação de lei complementar. Ao mesmo tempo [sou autor] da alteração do artigo 214, levando à condição constitucional o Plano Nacional da Educação, que até então era uma disposição transitória da LDB, como um articulador de um Sistema Nacional de Educação prometido e jamais realizado", resgatou.
Financiamento
Na avaliação de Gilmar Ferreira, a regulamentação do SNE precisa corrigir uma séria distorção de gestão que leva os municípios a arcarem com o atendimento quase que sozinhos do ensino fundamental, obrigação que não é somente deles: "Os estados são movidos pelas políticas de fundos - que nós entendemos ser importantes - mas eles se aproveitam para se desresponsabilizarem no atendimento das demandas. As consequências são de rebaixamento do valor aluno para o município, que precisa agregar recursos próprios para atender as necessidades da população de forma adequada", explica, e acrescenta: "o programa do atual governante aponta para repassar para os municípios outras responsabilidades, que não serão acompanhadas dos recursos necessários".
"Precisamos avançar para a construção da rede pública de ensino em que os estudantes da rede estadual tenham as mesmas condições de financiamento que um estudante da rede federal de ensino da educação básica", defende Gilmar Ferreira. "As reformas como a do ensino médio que flexibilizam ou que terceirizam o currículo precisam ser revogadas de forma urgente. A regulamentação do Sistema Nacional de Educação precisa apontar para o aumento de percentuais de investimento e criação de novas fontes de recursos, por isso é preciso combater qualquer tentativa de desconstitucionalização dos recursos da educação", alerta Ferreira.
Outros aspectos levantados pelo secretário de assuntos educacionais da CNTE foram a implantação de um Fundeb permanente e a ampliação da participação da União dos recursos destinados ao fundo. "É vergonhoso que a gente tolere o discurso de repassar recurso aos municípios com base em resultados, em meritocracia" argumenta. Para Gilmar Ferreira, é preciso superar a visão de valor mínimo ou valor médio aluno ano para assegurar CAQi (Custo Aluno-Qualidade Inicial) e o CAQ (Custo Aluno-Qualidade) - e sim pensar no valor que a educação necessita para se garantir a formação adequada dos filhos e filhas da maioria da população.
"A regulamentação do Sistema Nacional de Educação precisa atentar para as vias de desvinculação de recursos da educação como acontece com a Emenda Constitucional 95, que precisa ser revogada. Também é preciso impedir que se subsidie salários de inativos, com recursos da manutenção e desenvolvimento de ensino, ao mesmo tempo é preciso instituir formas mais claras da base de impostos uma vez que há estados que não aplicam os percentuais constitucionais de imposto de renda retido na fonte de renda na educação", avalia Gilmar Ferreira
Condições de trabalho
Para Gilmar Ferreira, o SNE precisa avançar nas condições da dedicação exclusiva de forma a assegurar melhores condições de desempenho profissional, em que o trabalhador atue em uma jornada única, em um único estabelecimento escolar. "A dupla e a tripla jornada é uma chaga na educação nacional que destrói vidas - sem contar as condições cruéis de aposentadoria que estão por vir", denunciou Gilmar Ferreira. Para ele é preciso incorporar as diretrizes nacionais de carreira, o piso salarial profissional, a formação inicial e continuada, a garantia de efetivação pessoal, que são condições sem a qual não acontecerá educação e aprendizagem de qualidade no país: "O SNE precisa apontar compromisso com a carreira, a remuneração e as condições de trabalho".
Ao final de sua intervenção, Gilmar Ferreira relembrou as palavras do mestre Carlos Abicalil, em 2002: "Do ponto de vista legislativo já trilhamos caminhos promissores. Porém diante de leis flexíveis é necessário continuar a disputa. Dada a origem fortemente descentralizada da oferta da educação pública brasileira, é importante resgatar elementos da carta magna que balizam o pacto federativo e sintetizam a possibilidade de convivência na frágil nação brasileira".
O secretário de assuntos educacionais da CNTE, Gilmar Ferreira, levantou diversos aspectos em relação à regulamentação do artigo 23 da Constituição Federal de 1988: "É verdade que já são mais de 30 anos e em termos de legislação muito avançamos. Mas em termos de práticas do que foi legislado ainda há muitas brechas que possibilitam a disputa pelos recursos da educação, cortes e a sua aplicação como está previsto", ressalta.
Gilmar Ferreira abriu sua intervenção descrevendo duas imagens contraditórias que o deixaram inquieto nos últimos dias. "A primeira é sobre a estudante de Cocal dos Alves, exibida em uma reportagem do Fantástico sobre o corte nas bolsas de estudos de ensino médio, no valor de 100 reais, e de 400 reais para quem avança e vai cursar uma faculdade. Em que pese o corte das bolsas se referir ao corte dos alunos de ciência e tecnologia, aquela jovem moradora da zona rural, alimenta um sonho raro para os tempos atuais: ela quer ser professora". Para Ferreira,os jovens estão perdendo acesso ao ensino superior não por falta de esforço das famílias, mas por questões financeiras, pelo corte de bolsas.
A segunda imagem citada por Ferreira é a do nosso atual Ministro da Educação que, diante de estudantes recebendo uma premiação "afirmou categoricamente que os mesmos não representavam alunos do Brasil inteiro pois o país não tem lugar para todos, só para os melhores". Para Gilmar Ferreira, é uma defesa direta da meritocracia, da premiação, sinalizando que o repasse de recursos para educação se dê em função da competição e de resultados: "Com certeza esse não foi o espírito da constituinte em 1987 e 1988, ao estabelecer o artigo 23 da CF/88", reflete.
Sobre o PLP 25/19
O Projeto de Lei Complementar (PLP) 25/19 regulamenta a criação do Sistema Nacional de Educação (SNE), conforme prevê o Plano Nacional de Educação (Lei 13.005/14 - PNE). De acordo com o PNE, o poder público fica obrigado a criar o SNE, por meio de lei específica, em até dois anos da data de publicação do plano. A proposta institui o Sistema Nacional de Educação (SNE), com normas para cooperação entre União, estados e municípios em políticas, programas e ações educacionais. O texto, da deputada Professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), tramita na Câmara dos Deputados.
O mestre em educação Carlos Abicalil - ex-presidente da CNTE e ex-deputado federal - também participou da audiência pública e destacou que um Sistema Nacional de Educação deve manter o "caráter democrático e popular capaz de se construir num pilar de sustentação de um Brasil justo desenvolvido e igualitário".
Abicalil fez um breve relato histórico de construção dessa legislação: "Tenho a grata felicidade de ser o autor da Emenda Constitucional 59, que alterou, no artigo 23, as leis complementares em plural em função de que um dos argumentos para não regulamentar a cooperação federativa era exatamente o tamanho da complexidade das linhas de ação do governo, que deveriam estar contempladas numa única formulação de lei complementar. Ao mesmo tempo [sou autor] da alteração do artigo 214, levando à condição constitucional o Plano Nacional da Educação, que até então era uma disposição transitória da LDB, como um articulador de um Sistema Nacional de Educação prometido e jamais realizado", resgatou.
Financiamento
Na avaliação de Gilmar Ferreira, a regulamentação do SNE precisa corrigir uma séria distorção de gestão que leva os municípios a arcarem com o atendimento quase que sozinhos do ensino fundamental, obrigação que não é somente deles: "Os estados são movidos pelas políticas de fundos - que nós entendemos ser importantes - mas eles se aproveitam para se desresponsabilizarem no atendimento das demandas. As consequências são de rebaixamento do valor aluno para o município, que precisa agregar recursos próprios para atender as necessidades da população de forma adequada", explica, e acrescenta: "o programa do atual governante aponta para repassar para os municípios outras responsabilidades, que não serão acompanhadas dos recursos necessários".
"Precisamos avançar para a construção da rede pública de ensino em que os estudantes da rede estadual tenham as mesmas condições de financiamento que um estudante da rede federal de ensino da educação básica", defende Gilmar Ferreira. "As reformas como a do ensino médio que flexibilizam ou que terceirizam o currículo precisam ser revogadas de forma urgente. A regulamentação do Sistema Nacional de Educação precisa apontar para o aumento de percentuais de investimento e criação de novas fontes de recursos, por isso é preciso combater qualquer tentativa de desconstitucionalização dos recursos da educação", alerta Ferreira.
Outros aspectos levantados pelo secretário de assuntos educacionais da CNTE foram a implantação de um Fundeb permanente e a ampliação da participação da União dos recursos destinados ao fundo. "É vergonhoso que a gente tolere o discurso de repassar recurso aos municípios com base em resultados, em meritocracia" argumenta. Para Gilmar Ferreira, é preciso superar a visão de valor mínimo ou valor médio aluno ano para assegurar CAQi (Custo Aluno-Qualidade Inicial) e o CAQ (Custo Aluno-Qualidade) - e sim pensar no valor que a educação necessita para se garantir a formação adequada dos filhos e filhas da maioria da população.
"A regulamentação do Sistema Nacional de Educação precisa atentar para as vias de desvinculação de recursos da educação como acontece com a Emenda Constitucional 95, que precisa ser revogada. Também é preciso impedir que se subsidie salários de inativos, com recursos da manutenção e desenvolvimento de ensino, ao mesmo tempo é preciso instituir formas mais claras da base de impostos uma vez que há estados que não aplicam os percentuais constitucionais de imposto de renda retido na fonte de renda na educação", avalia Gilmar Ferreira
Condições de trabalho
Para Gilmar Ferreira, o SNE precisa avançar nas condições da dedicação exclusiva de forma a assegurar melhores condições de desempenho profissional, em que o trabalhador atue em uma jornada única, em um único estabelecimento escolar. "A dupla e a tripla jornada é uma chaga na educação nacional que destrói vidas - sem contar as condições cruéis de aposentadoria que estão por vir", denunciou Gilmar Ferreira. Para ele é preciso incorporar as diretrizes nacionais de carreira, o piso salarial profissional, a formação inicial e continuada, a garantia de efetivação pessoal, que são condições sem a qual não acontecerá educação e aprendizagem de qualidade no país: "O SNE precisa apontar compromisso com a carreira, a remuneração e as condições de trabalho".
Ao final de sua intervenção, Gilmar Ferreira relembrou as palavras do mestre Carlos Abicalil, em 2002: "Do ponto de vista legislativo já trilhamos caminhos promissores. Porém diante de leis flexíveis é necessário continuar a disputa. Dada a origem fortemente descentralizada da oferta da educação pública brasileira, é importante resgatar elementos da carta magna que balizam o pacto federativo e sintetizam a possibilidade de convivência na frágil nação brasileira".
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