Ex-presidente disse a “O Estado de S. Paulo” que legitimidade do processo "está vindo da rua”.
FD/São Paulo
Ex-presidente disse a “O Estado de S. Paulo” que PSDB deve contribuir com Michel Temer, beneficiário do impeachment de Dilma.
Em entrevista ao jornal O Estado de São Paulo publicada neste final de semana, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso defendeu o afastamento de Dilma Rousseff da Presidência pelo Congresso.
“Com a incapacidade que se nota hoje de o governo funcionar, de ela resistir e fazer o governo funcionar, eu acho que agora o caminho é o impeachment”, disse.
Ele acrescentou que, no caso de o vice-presidente Michel Temer (PMDB) assumir o governo, o PSDB deve contribuir com ou sem cargos no ministério.
Consultado se o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), teria legitimidade para conduzir o impeachment, disse: “A legitimidade do impeachment não está vindo do Congresso hoje, está vindo da rua”.
Leia alguns trechos do ex-presidente da República:
No fim do ano passado, o senhor mantinha dúvidas em relação ao impeachment da presidente Dilma Rousseff. Mudou a percepção do senhor?
Mudou. Eu fui passo a passo. Cheguei a defender que ela tivesse um gesto de grandeza e renunciasse. Eu sempre procurei ter uma atitude serena em relação a esses processos políticos e especialmente em relação à presidente Dilma. Dificilmente você vai ver uma palavra agressiva minha em relação à presidente Dilma. Não apenas pela consideração institucional, mas também pessoal. Mas, com a incapacidade que se nota hoje de o governo funcionar, de ela resistir e fazer o governo funcionar, eu acho que agora o caminho é o impeachment. Se eu bem entendi o que as ruas gritaram, foi isso. As ruas gritaram (no dia 13) renúncia, fim, impeachment.
Mas o senhor sempre alertou que esse era um processo doloroso...
Continua sendo doloroso, mas os fatos se impõem. Tão doloroso quanto o impeachment é assistir ao desfalecimento da economia e da sociedade.
E a ação de seu partido, o PSDB, no TSE, para impugnar o mandato?
Ela é demorada e permite recurso no Supremo. Deve seguir, mas eu acho que, neste momento, se requer urgência para uma solução no Congresso.
E o pós-Dilma, caso o impeachment venha a se concretizar?
As instituições brasileiras estão mais sólidas do que estavam no impeachment do ex-presidente Fernando Collor (1992). Não há temor de um retrocesso institucional. Tudo na política depende não apenas das circunstâncias, mas da capacidade de condução do processo. No caso do impeachment, o natural é que assuma o vice, o Michel Temer. Vai depender dele e das forças que ele for capaz de juntar. O País quer a continuidade da Lava Jato, soluções para as questões econômicas prementes, respeito à institucionalidade.
Como o senhor avalia a crise?
Eu fiquei chocado com o que vi nesta última semana. A maneira pela qual pessoas que são detentoras de cargos públicos e, no particular, nas conversas, alimentam motivações, ideias e desejos que não são institucionais, usando inclusive palavras de baixo calão, falando “nessa hora vamos quebrar o pau, você tem de fazer não sei o que, não sei o que lá, tem de forçar...”
O senhor está se referindo aos grampos do ex-presidente Lula?
Não só do Lula. Do Lula eu fiquei mais estarrecido com o depoimento dele à Polícia Federal. Eu fiquei estarrecido, sabe por que? Porque eu também sempre que pude preservei a memória do Lula. Eu conheço o Lula há décadas, vi o Lula em São Bernardo (do Campo). Você se lembra que quando o Lula ganhou na eleição do candidato do meu partido e fiz tudo para que houvesse uma transição dentro das instituições. Foi com emoção que eu passei a faixa pra ele e vice-versa. São momentos densos historicamente. Você ver o Lula enterrar a própria história? Isso me dá tristeza. Eu não comemoro esse fato, me dá tristeza, bem ou mal o Lula teve um papel no Brasil. Você lê o depoimento dele à Polícia Federal... As palavras que ele usa, a negativa sobre qualquer responsabilidade sobre qualquer coisa. O Brasil está precisando do contrário disso. Se alguém vier a suceder a Dilma, esse alguém tem de transmitir ao País um sentido simbólico até de respeitabilidade, responsabilidade, cuidado com as palavras, atenção ao povo e, sobretudo, um sinal de que é capaz de unir o País. Não se trata apenas de coesão com os partidos, que estão na sua pior fase, se trata de coesão com o País. Quem vão ser os ministros? Pessoas que sejam comprometidas com as suas áreas.
O PSDB, se for chamado a participar de um novo governo, deve dizer sim?
O PSDB necessariamente deverá responder o que se espera dele, que é ajudar dar a dar rumo ao Brasil. Quem comanda é quem dá a pincelada fundamental, é o presidente. O PSDB não pode dizer “eu quero ser ministro”. O PSDB tem de perguntar ao presidente o que ele vai fazer com o País. Se estiver de acordo, tem de apoiar. Necessariamente, não significa ministério. Ir além disso é fazer especulação.
Qual seria a primeira tarefa do novo presidente?
Mudar a estrutura político-eleitoral. Isso não se faz do dia para a noite. A eleição, com as regras de hoje, repete a Câmara e o Senado. O sistema está truncado. Até 2018 tem de mudar isso. A rua não confia no sistema.
E o parlamentarismo?
Sou parlamentarista, mas hoje não há condição. Sem haver base partidária sólida, não tem como. O futuro presidente pode criar condições para. Parlamentarismo agora é o poder ao Congresso. Quem vai ser o primeiro ministro? O presidente da Câmara também é atingido (pela Lava Jato).
Eduardo Cunha tem legitimidade para conduzir o impeachment?
A legitimidade do impeachment não está vindo do Congresso hoje, está vindo da rua.
É possível reverter o cenário atual em curso ou a mudança é obrigatória na sua visão?
Quando há a ameaça de que esse governo vai ser substituído, a bolsa sobe e o dólar cai. A questão fundamental é de credibilidade. Chegamos a este ponto por erros acumulados de política econômica, mais da Dilma do que Lula. O Brasil saiu um pouco da linha da história.
Michel Temer tem condições de liderar este momento?
A história faz o líder.
* Leia mais política no site do Estadão.
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