Luís Roberto Barroso (Foto: Reprodução/Rádio Guaíba)
Por Rogério Tadeu Romano*
Dita a Súmula Vinculante nº 43: “é inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido”.
Pois bem.
Como noticiou o site de notícias da Tribuna do Norte, o ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, julgou procedente pedido da Procuradoria Geral da República contra nomeações em caráter efetivo de alguns servidores da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte que ocorreram em 2 de agosto de 1990.
Foi ainda noticiado que ao todo, a decisão pode atingir 163 pessoas. De acordo com a própria petição, pode haver casos já analisados pela Justiça anteriormente e, por isso, é preciso que se busque as informações individualmente, o que não é possível pelo STF, segundo Barroso. “Em relação aos servidores públicos listados na petição inicial como beneficiários do ato reclamado, constato que os documentos juntados aos autos não são suficientes para permitir um exame individualizado sobre suas situações funcionais”, disse o ministro Barroso.
No inquérito, o Poder Legislativo, listou os servidores de outras carreiras (Bandern, BDRN, Poder Executivo do Estado, Poder Executivo Municipal, dentre outros) que foram enquadrados em cargos efetivos no quadro de pessoal da Assembleia. Segundo o Legislativo disse nos autos, depois de implantado o regime constitucional de 1988, os provimentos no Quadro Geral de Pessoal da Assembleia Legislativa se deram a diversos títulos, com qualificação jurídica diferenciada. No entendimento de Barroso, a Assembleia não nega os enquadramentos, mas afirma que foram realizados com base em normas diversas das declaradas inconstitucionais na ADI 351.
Na decisão, por outro lado, o magistrado também explica que servidores já aposentados não poderão ser afetados pela atual decisão devido a decisões anteriores do próprio STF, que garante a continuidade do benefício a essas pessoas.
Tem-se da redação do artigo 37, II, da CF:
Art. 37.A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
II – a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998.
A Constituição Federal exige o concurso público de provas ou de provas e títulos para investidura em cargo ou emprego público. Ademais é mister que haja pertinência nas disciplinas escolhidas para comporem as provas, assim como os títulos, a que se reconhecerá valor com a função a ser exercida.
Por sua vez, Adilson Dallari(Regime constitucional dos servidores públicos, 2ª edição, Revista dos Tribunais, 1990, pág. 36) define concurso público como sendo “um procedimento administrativo aberto a todo e qualquer interessado que preencha os requisitos estabelecidos em lei, destinado à seleção de pessoal, mediante a aferição de conhecimento, da aptidão e da experiência dos candidatos, por critérios objetivos, previamente estabelecidos no edital de abertura, de maneira a possibilitar uma classificação de todos os aprovados”.
Bem lembrou Emerson Garcia(Provimento de cargos efetivos sem concurso público: reflexões sobre declaração de nulidade, prazo e segurança jurídica, in Revista do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro nº 73, jul./set. 2019,|79) que “a Constituição de 1988 restabeleceu, em seu art. 37, II, a exigência de prévia aprovação em concurso público, de provas ou de provas e títulos, para a investidura em qualquer cargo ou emprego público, o que tornou injurídicas as figuras da transposição entre cargos e da ascensão funcional. Não, obviamente, sem que alguns obstáculos tivessem que ser superados. A ascensão funcional como forma de acesso aos cargos públicos foi praticada de 1987 a 1992, período no qual o entendimento a respeito do tema não era pacífico. Apenas em 17 de fevereiro de 1993 o Supremo Tribunal Federal suspendeu, com efeito ex nunc, a eficácia dos arts. 8º, III; 10, parágrafo único; 13, §4º; 17 e 33, IV, da Lei nº 8.112/1990, que veiculou o Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União, dispositivos declarados inconstitucionais em 27 de agosto de 1998.”
Como ainda acentuado por Emerson Garcia(obra citada), “a Lei nº 9.784/1999, que regulou o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal, tratou da anulação, da revogação e da convalidação em seus artigos 53 a 55. A anulação, nos termos do art. 53, decorre de vício de legalidade, enquanto a revogação deve estar embasada em razões de conveniência e oportunidade, distinção há muito consagrada na Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal. A Administração, de acordo com o art. 54, decai em cinco anos do direito de anular os atos administrativos dos quais decorram efeitos favoráveis para os destinatários, salvo comprovada má-fé.30 Como se percebe, a incidência, ou não, do limitador temporal de cinco anos está associada à comprovação, ou não, da má-fé. A possibilidade de convalidação pelo decurso do tempo indica estarmos perante um ato anulável; quando essa convalidação não se mostra possível, a hipótese é de nulidade.”
A Constituição de 1988 utiliza apalavra investidura para designar o preenchimento de cargo ou emprego público. Como bem disse Celso Ribeiro Bastos(Comentários à Constituição do Brasil, volume III, tomo III, 1992, pág. 67), não se fala mais, como ocorreu, no passado, em primeira investidura, para deixar certo de que se cuida de todas as hipóteses em que se dá a condição de ingresso no quadro de servidores públicos.
Assim a Constituição repudia aquelas modalidades de desvirtuamento da Constituição anterior criadas por práticas administrativas, que acabaram por custar o espírito do preceito.
Exemplificou Celso Bastos com o que acontecia com o chamado instituto da transposição, que com a falsa justificativa de que o beneficiado já servidor público era, guindava-o para novos cargos e funções de muito maior envergadura e vencimentos que não nutriam, contudo, relação funcional com o cargo de origem, com o beneplácito da legalidade sob o fundamento de que primeira investidura já não era Ficam tão-somente excluídas aquelas ascensões funcionais que se dão dentro do desdobramento normal de uma carreira ou mesmo de mudanças de cargos que se dão na forma dos estatutos dos funcionários públicos. Contudo é indispensável que esse provimento se dê em decorrência de uma ocupação anterior de um cargo ou emprego público do qual o novo posto provido seja um consectário normal ou da evolução funcional na carreira, legalmente instituída, ou da necessidade de a Administração realocar seus servidores em repartições diferentes, que são formas de provimento derivado em oposição ao provimento originário, como ensinou Celso Bastos(obra citada, pág. 68).
Muito conhecidos são os chamados desvios de função, onde se vê cargos distintos. Pois bem: O Supremo Tribunal Federal não admite o enquadramento, sem concurso público, de servidor em cargo diverso daquele de que é titular. Nesse sentido, tem-se o julgamento do RE 311.371-AgR-ED/SP, Relator Ministro Eros Grau.
Essa maneira de pensar, após diversas e reiteradas decisões, levou ao Supremo Tribunal Federal a editar a Súmula 685: “É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido”.
Em resumo: para galgar a condição de servidor hoje, só há as portas do provimento do cargo ou emprego público, por concurso público, não existindo possibilidade de alguém ser investido em função pública desconectada de um cargo ou emprego.
Digo isso fundado no fato de que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de que a promoção do servidor por ascensão funcional constitui forma de provimento derivado incompatível com a determinação prevista no art. 37, II, da Constituição de que os cargos públicos devem ser providos por concurso.
Por essa razão, este Tribunal, em diversos precedentes, extirpou do ordenamento diplomas legais que, após a Constituição de 1988, previam essa forma de preenchimento de cargos públicos.
Nesse sentido, citam-se as seguintes decisões, entre outras: ADI 368/ES, ADI 231/RJ e ADI 837/DF, Rel. Min. Moreira Alves; ADI 3.582/PI, Rel. Min. Sepúlveda Pertence; ADI 3.030/AP, Rel. Min. Carlos Velloso; ADI 1.345/ES, Rel. Min. Ellen Gracie.
O entendimento do STF está fincado no julgamento da medida cautelar na ADI 837/DF, Rel. Min. Moreira Alves, que suspendeu os dispositivos da Lei 8.112/1993 que previam o provimento derivado de cargos públicos com eficácia apenas ex nunc se deu em razão de essa ser a regra no deferimento de medidas cautelares em Ações Diretas de Inconstitucionalidade.
Essa mais uma lição do Supremo Tribunal Federal a firmar que o concurso público é a forma única de ingresso em carreira no serviço público em cargo denominado efetivo.
Lembre-se que Cargo efetivo é aquele que pode ser exercido exclusivamente por meio de aprovação em concurso público de provas, ou de provas e títulos.
*É procurador da República aposentado com atuação no RN.
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