Foto: Reprodução/Super Interessante
No Budismo, o Universo é eterno, sem começo ou fim. Existem apenas
ciclos de criação e destruição, chamados mahākalpa. Cada mahākalpa tem
quatro subdivisões temporais, os kalpas. No primeiro kalpa, o mundo
nasce, e semideuses reluzentes com 80 mil anos de vida cruzam os céus. O
segundo kalpa, em que nós vivemos, é imperfeito, com decadência, guerra
e miséria. O terceiro estágio é a dissolução do cosmos em fogo. E o
quarto é o vazio absoluto – um interlúdio. É então que o vento
primordial planta a semente do próximo mahākalpa.
Trata-se de uma cosmologia cíclica, típica das religiões do
subcontinente indiano. Ela é bem diferente da criação na concepção
judaico-cristã, em que Deus faz o mundo, vê que ele é bom e deixa o
reality show rolar – sem data de validade. Todas as etnias têm uma
cosmologia, que se apresenta em um desses dois tipos: ou o Universo é
eterno e cíclico, ou emergiu em um instante único.
Essa dicotomia básica se mantém viva entre os cosmólogos – físicos
que investigam a estrutura e a história do cosmos. A maioria deles
advoga que o Universo teve um início definido, num estado denso e
quente, e vem se expandindo desde então (o Modelo Cosmológico Padrão,
popularmente chamado de Big Bang). Mas um grupo divergente propõe que o
Universo infla e esvazia como um balão – e que a fase de expansão atual,
em que as galáxias estão se afastando umas das outras, foi precedida
por uma fase de contração. Um mahākalpa anterior ao nosso.
Um dos maiores estudiosos de universos cíclicos trabalha em um
escritório no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), no bairro
carioca da Urca. Mário Novello nasceu no Rio de Janeiro em 1942, filho
de imigrantes italianos da província da Calábria. Aos 12 anos, ganhou do
pai o livro O Universo e o Sr. Einstein, de Lincoln Barnett. E decidiu
que dedicaria a vida à cosmologia – ainda que a palavra sequer existisse
na época. “Meu pai riu e falou: bom, compete a você fazer isso. Acabou
que aconteceu mesmo.”
Novello cursou física na Faculdade Nacional de Filosofia (hoje
Universidade Federal do Rio de Janeiro, a UFRJ) com alguns professores
lendários – como José Leite Lopes, especialista em partículas que se
doutorou em Princeton orientado por Wolfgang Pauli. Leite, diga-se, foi
um dos fundadores do CBPF, onde Mário começou a estagiar durante a
graduação. Era um lugar bem frequentado: às vezes, César Lattes, um dos
descobridores da partícula subatômica méson pi, fazia uma visita.
Em 1968, com o decreto do AI-5, Leite Lopes foi cassado pela Ditadura
Militar. Preocupado com os rumos da ciência nacional sob a opressão do
regime, ele recomendou a seu pupilo que fosse fazer doutorado na
Universidade de Genebra, na Suíça, com Josef-Maria Jauch. Foi então que
Novello saiu do mundo das partículas subatômicas – área de
especialização de seu mentor brasileiro – e começou a se envolver com o
estudo do cosmos, seu objetivo desde a adolescência.
Em 1979, já com uma carreira sólida, Novello publica um modelo
pioneiro de Universo com boucing, isto é: um Universo como o proposto
pelo Budismo – que de tempos em tempos entra em colapso, atinge um
tamanho minúsculo e volta a se expandir, reciclando seu conteúdo de
matéria e energia. Nessa visão, não há Big Bang: o Universo não precisa
ser criado, porque ele sempre existiu. É um debate esotérico, que deve
ser explicado com calma. Se o Universo se expande, como pode ele se
contrair? O que exatamente é o Big Bang? Houve algo antes dele? Para
entender a obra de Novello, é preciso mergulhar na física do século 20.
Vamos nessa.
A origem
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