A Emenda à Constituição aprovada na Câmara dos Deputados começa a tramitar no Senado e não tem aprovação fácil.
Sem votos suficientes para aprovar a PEC dos precatórios no Senado, o governo analisa sugestões dos parlamentares para carimbar recursos para o Auxílio Brasil e tornar o programa permanente, ainda que a mudança signifique uma tramitação mais demorada e retorno do texto à Câmara dos Deputados. Entre senadores governistas, circula uma tabela que aponta apenas 40 votos favoráveis garantidos e outros 13 possíveis – um cenário de indefinição diante da necessidade de apoio de 49 congressistas para a aprovação.
O
retrato do placar acendeu o alerta no governo, que agora trabalha para
virar votos e sensibilizar senadores sobre a importância da proposta
para viabilizar o pagamento de ao menos R$ 400 aos beneficiários do
programa social.
Mesmo a emenda apresentada
pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE), José Aníbal (PSDB-SP) e
Oriovisto Guimarães (Podemos-PR), propondo a retirada das despesas com
dívidas judiciais do alcance do teto de gastos (que limita o avanço das
despesas à inflação), teria um apoio limitado. Nas contas do governo,
segundo apurou o Estadão/Broadcast, essa versão tem hoje “49 votos
cravados” a favor, o que dá pouco conforto à base aliada para levar o
texto à votação sem riscos de derrota.
O
presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), se reuniu ontem, com o
líder do governo na Casa, Fernando Bezerra (MDB-PE), que também é o
relator da PEC. Segundo apurou a reportagem, a disposição de Pacheco e
da cúpula do Senado é aprovar a PEC, mas não na forma que o governo
quer. O presidente do Senado tem defendido a interlocutores que a
proposta não se transformará em uma "farra fiscal" com a digital do
Senado, com espaço para o uso dos recursos a outras finalidades que não o
programa social.
Diante dessas negociações,
Bezerra estuda "fatiar" a PEC para incorporar sugestões de senadores e
assegurar o pagamento do Auxílio Brasil de R$ 400 ainda em dezembro.
Segundo ele, a ideia é fazer mudanças mantendo o texto já aprovado na
Câmara dos Deputados. A partir daí, haveria duas opções, sendo a
primeira promulgar a parte do texto já avalizada pelas duas Casas e
enviar a “PEC paralela”, com as mudanças, para a Câmara dos Deputados,
sob compromisso de votação rápida.
Bezerra
afirmou, porém, que não descarta um retorno de todo o texto à Câmara,
para nova votação em globo. “O fatiamento é uma possibilidade, mas não
tem decisão tomada sobre isso”, afirmou o líder o governo. “Isso
dependerá da natureza das alterações que serão inseridas no meu
relatório”, acrescentou.
As mudanças que estão
em estudo incluem um “carimbo” nos recursos liberados com a mudança no
teto de gastos e nos precatórios. Segundo Bezerra, a folga seria
destinada apenas ao Auxílio Brasil, a despesas obrigatórias ligadas à
assistência social e à Previdência e aos mínimos constitucionais da
saúde e educação. Também estão em negociação a previsão de que o novo
programa de transferência de renda será permanente, a criação de uma
auditoria ou comissão mista para analisar a evolução das dívidas
judiciais e algum mecanismo de previsibilidade para o pagamento dos
precatórios dos Estados.
A negociação por
mudanças, crucial para a aprovação ser viável, desagrada integrantes do
governo por diferentes motivos. Uma das preocupações é a necessidade de
nova votação na Câmara dos Deputados, já admitida pelo próprio líder do
governo no Senado. Isso pode atrasar ainda mais o cronograma de
pagamento do Auxílio Brasil de R$ 400.
Além das
restrições da lei eleitoral, que obrigam o governo a implementar a
mudança até 31 de dezembro, há preocupação com o impacto do atraso sobre
a população. Nos primeiros dias de pagamento do novo Auxílio Brasil,
beneficiários fazem fila em busca de informações e sacar os recursos,
muitos frustrados porque já esperavam que o valor de R$ 400 prometido
pelo presidente Jair Bolsonaro fosse pago em novembro.
A
promessa do governo é pagar os R$ 400 em dezembro, com um valor
retroativo referente à diferença devida em novembro. Embora seja viável
rodar uma folha extraordinária para complementar o benefício assim que a
PEC for aprovada, há o temor de que isso provoque ainda mais
desencontros e confusão entre os beneficiários, muitos dos quais teriam
de se deslocar novamente para sacar o dinheiro.
Entre
técnicos da área econômica, há também uma preferência pela aprovação do
texto como veio da Câmara dos Deputados, não só pela celeridade, mas
pelo conteúdo. A equipe econômica entende que, ao criar um subteto para o
pagamento dos precatórios (dívidas judiciais), a regra permanente dará
previsibilidade a esse gasto daqui para frente.
Além
disso, a proposta de carimbar recursos na PEC para bancar o Auxílio
Brasil vai contra o mantra da equipe de evitar vinculações de maneira
geral. Os técnicos, porém, entendem que esse é um ponto sensível para os
senadores (que temem o uso do espaço fiscal para outras finalidades,
como reajustes de servidores ou emendas parlamentares). Por isso, não
seria um problema acatar esse ponto da proposta.
Há
ainda o desejo dos senadores de que a ampliação do Auxílio Brasil para
R$ 400, hoje temporária devido à ausência de uma fonte de receitas para
financiar o aumento permanente de gastos, seja duradoura. Para isso, uma
hipótese possível seria prever na PEC o afastamento da necessidade de
fonte permanente de recursos (hoje exigida na Lei de Responsabilidade
Fiscal). Esse é um ponto ainda em aberto.
Lira cogita 'fatiamento' da proposta
O
presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), disse esperar a
manutenção de quase todo o texto da Proposta de Emenda à Constituição
(PEC) dos precatórios no Senado, mas admitiu que o texto pode ser
"fatiado" para garantir o pagamento de R$ 400 de benefício no Auxílio
Brasil, o programa que substitui o Bolsa Família.
A
PEC enfrenta resistências no Senado. Há pressão para carimbar os
recursos com a abertura do espaço no teto de gastos em 2021 e
estabelecer um caráter permanente para o Auxílio Brasil. O governo, no
entanto, quer aprovar a PEC para garantir o pagamento de um benefício
social de R$ 400 até dezembro do ano que vem.
Dessa
forma, o Senado poderia aprovar parte da PEC, liberando o texto
chancelado pelos deputados e senadores para promulgação, e a Câmara se
debruçaria sobre as mudanças por meio de uma proposta paralela. "Eu
espero e torço para que o texto tenha sua aprovação mantida em 95%, 96%.
Sempre há aqueles dispositivos de que textos comuns possam ser
promulgados e alguma diferença a gente possa trazer", afirmou Lira em
entrevista coletiva na Câmara.
O
presidente da Câmara disse esperar a aprovação da PEC dos precatórios
até o dia 30 de novembro no Senado e garantiu celeridade dos deputados
para avaliar eventuais alterações. De acordo com ele, as conversas entre
as lideranças das duas casas "têm sido boas" e que o clima é "muito
positivo" para aprovação da proposta e implantação do Auxílio Brasil.
Lira
não deu detalhes de como a PEC abriria espaço no Orçamento para o
pagamento do benefício de R$ 400, já que os pontos polêmicos são
justamente os que garantem a folga: postergar o pagamento de uma parte
dos precatórios (dívidas que o governo é obrigado a pagar por decisão da
Justiça) e alterar a correção do teto de gastos, a regra que impede que
as despesas cresçam em ritmo superior à inflação. Com as duas medidas, a
folga no Orçamento de 2022 será de R$ 91,6 bilhões.
Nos
primeiros dias de pagamento do novo Auxílio Brasil, beneficiários fazem
fila em busca de informações e sacar os recursos, muitos frustrados
porque já esperavam que o valor de R$ 400 prometido pelo presidente Jair
Bolsonaro fosse pago em novembro (em média, o benefício vai ser de R$
224 este mês).
Arthur Lira
afirmou que não vê espaço para reajuste aos servidores em 2022 com a
aprovação do texto. "Eu absolutamente não vi esse espaço, não conheço
esse espaço. Os números que foram apresentados pela Economia para a
Câmara dos Deputados não previam esse aumento e eu penso que aquele
portfólio de custos que foi amplamente divulgado pela imprensa possam
ser honrados para que tenha fidedignidade do que foi acertado nas
discussões de plenário", disse Lira em entrevista coletiva na Câmara.