Desembargador Cláudio Santos: “Se fosse uma empresa, poderia dizer que o TJ está quebrado”

Novo presidente exonera 100 comissionados e suspende gratificações. Medidas, contudo, ainda são insuficientes

Foto: José Aldenir

Com a maior média salarial do Brasil, os funcionários do Tribunal de Justiça do RN devem estar tranquilos financeiramente. Acima do “limite legal” de gastos com a folha, estabelecido pela Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), e precisando cortar gastos, o Poder Judiciário a qual eles pertencem, no entanto, segue em grave crise financeira. Por isso, neste primeiro pacote de medidas de austeridade anunciadas pelo desembargador Cláudio Santos, os funcionários foram os mais atingidos, com a exoneração de 100 cargos comissionados (já publicada no Diário Oficial) e a suspensão das gratificações pagas a servidores.
O problema é que, nem assim, o desembargador Cláudio Santos acredita que será possível fazer com que o Judiciário potiguar fique abaixo ao limite legal. Ou seja: a situação “vexatória” continuará por mais algum tempo – anos. “Nós vamos nos preocupar em enquadrar o Tribunal de Justiça na Lei de Responsabilidade Fiscal. Como disse no meu discurso de posse, essa situação é, antes de tudo, vexatória, porque nós julgamos os outros gestores públicos que desbordam da LRF. Inclusive, todos os órgãos, Prefeitura, Tribunal de Contas, Ministério Público, o julgamento é aqui conosco. Então, é vexatória porque nós devemos dar o exemplo”, afirmou Cláudio Santos.
Com um orçamento anual de, aproximadamente, R$ 900 milhões e gastando mais de R$ 60 milhões, por mês, com folha de pessoal, o TJRN terá que reduzir as despesas com pessoal, que hoje representam quase 7% da receita corrente líquida do Estado (o limite é 6%), para atender a determinação do Tribunal de Contas do Estado (TCE). Já para cumprir o que determinou o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o Judiciário terá que cortar 240 cargos comissionados nomeados de forma irregular. Ou seja: o desembargador Cláudio Santos ainda precisa reduzir mais 140 nomes de seu quadro de pessoal.
“Ainda temos, de acordo com o Conselho Nacional de Justiça, diminuir mais 140 cargos e eu não sei, com toda franqueza, como vou fazê-lo agora, porque isso implicaria numa grave ameaça ao normal funcionamento do Poder Judiciário do RN”, afirmou Cláudio Santos, acrescento que se reunirá com o CNJ para tentar rever, ao menos, essa parte.
Até porque, mesmo com todas essas exonerações, suspensão de gratificações e corte de contratos terceirizados se confirme, o TJRN ainda não conseguirá cumprir o que exige o TCE. “São muitas medidas, mas acredito que vá reduzir muito pouco”, afirmou o desembargador, acrescentando que, para sair do limite legal, talvez só seja possível mesmo com o crescimento da economia – isso é, se ela crescer. “Estamos completamente engessados”, avaliou o novo presidente.
Veja, abaixo, os principais momentos da entrevista coletiva do novo presidente do Judiciário potiguar, o desembargador Cláudio Santos:
“TJRN tem maior média salarial do Brasil. E nosso Estado é pobre”
Essas medidas são suficientes?
Cláudio Santos: São o começo, porque nós não vamos conseguir nos adequar somente com isso a LRF, aos 6% da receita corrente líquida. A Lei manda que, primeiro, nos possamos exonerar cargos comissionados. Depois, manda que se pode chegar até a demissão de cargos efetivos. Temos que fazer todas as economias que podemos fazer. Naturalmente que algumas terão que ser aprovadas pelo Pleno antes de seguir para a Assembleia Legislativa. As que são da Presidência, já são tomadas e são irreversíveis.
Quais setores foram atingidos com os cortes dos comissionados?
CS: Até agora só mexi no Tribunal de Justiça. Nós temos depois que adequar os cargos comissionados de primeiro grau. Com a deficiência de juízes, nós temos 100 vagas (abertas) de juízes no RN, nós temos 35 comarcas sem juiz titular, o que é um absurdo não conseguimos terminar esse concurso, na hora que eu tirar, também, todos os comissionados, aí vou desestruturar ainda mais o primeiro grau. Inclusive, me comprometi  com os próprios magistrados de, no prazo de 30 dias, estudar alternativas, porque nós precisamos ter uma base de julgamentos, a melhor possível dentro dessa situação.
Isso pode deixar a Justiça estadual mais lenta?
CS:Não sei, sabe? Pode ser que sim, pode ser que não, porque as vezes muito funcionário atrapalha quem quer trabalhar. Talvez até deixe mais espaço para quem quer trabalhar. Alguns setores tem gente demais.
Haverá redução também de contratos?
CS:Nós estamos nesses contratos terceirizados fazendo o que a lei nos permite. Devolvendo carro, servidor… Vou diminuir diária, determinados custos… As medidas iniciais são essas. Nós esperamos a compreensão de todos. É preciso que os funcionários e magistrados tenham comprometimento com o interesse público. Lamento, mas a realidade é essa. O ideal seria o presidente chegar aqui e anunciar contratação, isso e aquilo, mas eu tenho o dever de cumprir a lei.
O quanto de gastos serão cortados com essas medidas?
CS:São muitas medidas, mas acredito que vá reduzir muito pouco. Não temos ainda a repercussão financeira total, mas “muito pouco” porque eu tenho que atender aos princípios constitucionais, inclusive, a irredutividade de vencimentos, então, não posso baixar a remuneração de ninguém. O que posso é baixar a gratificação, exonerar cargos comissionados, tirar auxílios. Isso a gente pode fazer, uma parte através de lei, com a Assembleia aprovando, mas, noutra parte, nos estamos imobilizados
Qual a mensagem o TJRN passa com esses cortes?
CS:A boa vontade do Poder Judiciário de se ajustar as bordas da Lei. Agora, tem um problema: nós temos que obedecer a 6% da receita corrente líquida do Estado, então, se a economia crescer bastante, talvez nós possamos cumprir isso em seis anos. Mas se não houver crescimento, nós só vamos poder cumprir isso em 10 anos. Imagine como isso é complicado para o Judiciário, 10 anos engessado? Esse fato, se fosse numa empresa privada, eu poderia dizer que o Poder Judiciário está quebrado. Se fosse numa empresa privada, porque essa figura não existe em Direito Público. Mas, o fato é que temos R$ 136 milhões fora da folha normal para ser absorvida na folha normal. O que o Tribunal de Contas quer é isso, com justa razão e nós temos que nos enquadrar.
Com o aumento no STF, poderá haver também o aumento dos juízes estaduais, pelo escalonamento…
CS:Nas conversas que tivemos com o Tribunal de Contas do Estado, ficou acertada que, quando se tratasse de questão nacional, de escalonamento do ministro do Supremo Tribunal Federal, haveria de ficar fora dessas contas com relação à LRF. Então, o reajuste está garantido. Só não sei se está garantido o dinheiro.
E os concursos públicos? Serão suspensos?
CS: Continua o concurso público para juiz e para o cartório. Para servidor, é esse o engessamento que eu falo: não tem a menor condição. Nós temos quase 2 mil servidores efetivos, mais mil e tantos servidores cedidos, requisitados, encostados… Enfim, tudo que você pode imaginar aqui.
Como o TJRN chegou a essa situação?
CS: GTNS. O problema é que a Gratificação de Técnico de Nível Superior foi instituída em 93, 94, e dizia que, naquela época de alta inflação, os salários foram reajustados em 30% dos técnicos de nível superior, sem especificar o que era. Depois chegou a 100%. Posteriormente, com a imaginação criativa dos advogados, acharam uma brecha na lei para dizer que todos os que tivessem nível superior no Estado, incluindo aí Tribunal de Contas, Ministério Público, Poder Judiciário, tinha direito aos 100%, inclusive, quem entrou depois. De qualquer maneira, isso implicou no aumento de 100% nos vencimentos de todos os funcionários efetivos. Os cargos de confiança do TJ, hoje, são remunerados com os mesmo valores de 10 anos atrás. Estão muito defasados, mas não há como, absolutamente, atualizar isso. Nós temos o maior cargo, é apenas um, de secretário-geral, que é de R$ 13 mil brutos. Todos os demais, 70% ou 80%, são em torno dos R$ 5 mil.
E o TJRN é o que tem a maior média salarial de todos os TJs…
CS: O fato é que nós precisamos dar uma guinada nessa cultura. O Poder Judiciário remunera muito melhor que todos os demais poderes e órgãos e o Estado é pobre. Não pode o Tribunal de Justiça do RN ter a maior remuneração média de todos os tribunais do Brasil, se você tem São Paulo, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, que têm outra estrutura. O RN não produz riqueza nenhuma. O que é que nós produzimos? Um estado semi-árido, o turismo caindo, a parte agropecuária se reduz a melão e a cana-de-açúcar. Enfim. Nós temos que pensar numa forma de diminuir esses gastos públicos de maneira geral. Eu não estou me dirigindo, absolutamente, a ninguém, mas isso será feito inexoravelmente no Brasil todo. Nós temos que começar a pensar nisso. Não é possível que toda a população trabalhe para remunerar determinadas categorias de uma maneira exacerbada.
MEDIDAS DO TJRN PARA CORTAR GASTOS
Exoneração de 100 cargos comissionados
Congelamento e absorção da Gratificação de Técnico de Nível Superior (GTNS)
Suspensão da concessão e do pagamento das gratificações de Diretores de Secretaria
Extinção do Adicional por Tempo de Serviço (ATS)
Gratificação dos servidores cedidos será substituída
Extinção de gratificações dos Oficiais de Justiça
Extinção de todas as Gratificações de Gabinete
Redução nos contratos de terceirização vigentes
As empresas contratadas serão chamadas a renegociar os contratos, com a finalidade de redução de 25% dos valores atuais.
Valor mensal atual dos contratos de terceirização e locação de veículos: R$ 2.149.401,26
Redução pretendida: R$ 536.625,35
Valores mensais pretendidos: R$ 1.612.775,91
Total de pessoal terceirizado contratado: 743 prestadores de serviço terceirizados
Redução pretendida: Aproximadamente 180 prestadores de serviço terceirizados
Veículos locados pelo TJRN: 38
Veículos que serão devolvidos: 11
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