Numa resposta politicamente calculada ao dano de imagem gerado pela
manutenção do mandato do deputado federal Natan Donadon, a Câmara
aprovou na noite desta terça-feira (3) o fim do voto secreto no
Congresso.
A proposta estava engavetada há sete anos, depois de ter sido aprovada em primeiro turno em setembro de 2006.
O sigilo do voto é visto, pelos próprios parlamentares, como causa do
resultado favorável a Natan Donadon, preso desde junho, condenado por
desvio de dinheiro público.
A decisão, que também se aplica a Assembleias Legislativas e Câmaras
Municipais, atinge votações de cassações de mandatos e análises de vetos
presidenciais, entre outros pontos hoje votados de forma sigilosa.
A votação em plenário contou com folgada maioria após acordo de líderes
pela aprovação do texto. Foram 452 votos a favor. Entre eles, o do
deputado Pedro Henry (PP-MT), condenado no processo do mensalão e que
poderá passar por processo de cassação na Casa. Os demais deputados
condenados no escândalo, João Paulo Cunha (PT-SP), José Genoíno (PT-SP) e
Valdemar Costa Neto (PR-SP), não votaram. Genoíno está em licença
médica.
A proposta, contudo, ainda terá de passar pelo Senado antes de entrar em vigor.
Deputados abrem faixa no plenário pedindo o voto aberto nas votações da Câmara; projeto será analisado nesta terça pela Casa |
No entanto, o efeito pode ser exatamente o contrário do declarado pelos deputados, em dois fatores: velocidade e conteúdo.
A proposta aprovada nesta terça é a PEC 349, apresentada em 2001 pelo ex-deputado Luiz Antônio Fleury (PTB-SP).
Desde 2006, aguardava ser pautada pela presidência da Câmara para ser
votada em segundo turno. Com a falta de consenso sobre o tema, a
proposta foi abandonada. Somente hoje, sua "ressurreição" foi discutida
politicamente na Câmara. A decisão de colocá-la em votação foi anunciada
na manhã desta terça pelo presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves
(PMDB-RN), e ratificada pelos líderes partidários no início da tarde do
mesmo dia.
Com a aprovação, vai para o Senado, onde terá de tramitar por cerca de
dois meses até poder ser ratificada pelos senadores e promulgada --isso
num cenário de pleno acordo e vontade política.
No entanto, há uma outra proposta, a PEC 196, que também acaba com o
voto secreto, mas apenas para cassações de mandatos. Sua vantagem é que
ela já foi aprovada no Senado e agora tramita numa numa comissão
especial da Câmara. Segundo o próprio presidente da Câmara, poderia ir a
plenário em duas semanas, sendo definitivamente aprovada até o início
de outubro.
Quem desenha o cenário provável diante da aprovação da PEC 349 é o líder do PMDB, Eduardo Cunha (RJ).
"Se eu já votei voto aberto para tudo, eu não vou votar uma segunda. É
redundante. É contraditório. Eu disse isso na reunião de líderes: essa
parte eu não aceito", afirmou Cunha. "A gente pode até tentar votar [a
PEC 196], mas vai ficar um discurso vencido aqui na Câmara."
A ponderação de Cunha vai contra o caminho declarado por Henrique Alves, que defende ação "em duas frentes".
A aprovação da PEC 349, portanto, pode significar o enterro político da
outra proposta, fazendo com que a decisão sobre o fim do voto secreto
fique com o Senado.
Outro problema é que a aprovação na Câmara não impede que o Senado
modifique o texto. Assim, depois de uma tramitação mais lenta, os
senadores poderão tirar o voto aberto para casos como a análise de vetos
presidenciais, por exemplo.
Henrique Eduardo Alves diz que irá conversar com o presidente do Senado,
Renan Calheiros (PMDB-AL), para que o texto seja mantido.
No entanto, líderes partidários, da base e da oposição, têm discurso semelhante: o Senado tem seu ritmo.
"A Câmara está fazendo sua parte. Ponto", disse Eduardo Cunha. O líder
do PT, José Guimarães (CE), vai na mesma linha: "O que o Senado fará
depende dos entendimentos." Carlos Sampaio (SP), líder do PSDB, disse
que "o Senado tem seu tempo de apreciação".
Fonte: Folha de SP