BRASÍLIA - O governo quer alterar a forma de cálculo das aposentadorias para pressionar os trabalhadores a contribuírem por mais tempo para a Previdência Social. A medida faz parte da proposta de reforma que está sendo elaborada pela área econômica. A ideia é apresentar uma fórmula pela qual as pessoas que atingirem os requisitos mínimos para se aposentar passem a ter um ganho adicional se ficarem mais tempo no mercado de trabalho. Segundo técnicos a par das discussões, quanto mais tempo adiar o pedido de aposentadoria, mais chance o segurado terá de levar para casa um benefício integral.
Dificilmente os trabalhadores brasileiros conseguem receber 100% do valor do benefício. Ou são afetados pela regra de cálculo quando se aposentam por tempo de contribuição, mas são ainda jovens, ou contribuíram por pouco tempo e requerem aposentadoria com idade avançada. No novo modelo, como os segurados serão obrigados a atingir 65 anos para pedir o benefício, cresceriam as chances de se chegar ao valor máximo, dependendo do tempo de contribuição.
Uma das ideias é adotar a mesma sistemática que existe hoje para quem se aposenta por idade (65 anos). Essa pessoa recebe como benefício 70% da média das contribuições mais altas feitas ao INSS ao longo da vida, acrescida de 1% sobre a média para cada ano de contribuição. Assim, hoje, quem se aposenta com 65 anos de idade e 15 anos de contribuição recebe aposentadoria de 85% (ou seja, 70% mais 15). No modelo novo, os trabalhadores receberiam 60% da média das contribuições, mais 1% por ano na ativa. O percentual do prêmio será menor porque, com a reforma, todos os trabalhadores terão de atingir a idade mínima de 65 anos para se aposentar, já sendo obrigados, portanto a passar mais tempo na ativa.
Para se ter uma ideia, considerando a renda média do trabalho (Pnad/IBGE) em 2014 de R$ 1.785, um homem de 65 anos e 15 anos de contribuição, tempo mínimo exigido hoje, receberia uma aposentadoria de R$ 1.517; se esse trabalhador esticar o tempo na atividade em cinco anos (total de 20 anos de contribuição), o valor subiria para R$ 1.607; em mais cinco anos, para R$ 1.696; e, quando somar 30 anos de contribuição, teria o benefício integral — pela regra atual.
Na regra nova, o valor cairia para R$ 1.339 (com 15 anos de contribuição); com 20 anos, seria de R$ 1.428; com 25 anos, de R$ 1.517; com 30 anos, passaria para R$ 1.607; e, ao fim de 40 anos de contribuição, o benefício chegaria a R$ 1.785.
A equipe que está desenhando a reforma ainda está fazendo as contas para definir quais serão os percentuais exatos. A mudança na forma de cálculo, segundo técnicos, é necessária para trazer equilíbrio fiscal, e não basta apenas fixar uma idade mínima porque as despesas podem aumentar no futuro.
Além de fixar uma idade mínima, o governo pretende elevar o tempo mínimo de contribuição dos atuais 15 anos para 20 anos. Já está definido que quem tem menos de 50 anos terá de cumprir as novas regras integralmente, e quem tiver 50 anos ou mais até a aprovação da reforma terá regras de transição, com pedágio de até 50%.
— Ao fazer o corte por idade, o governo conseguirá resolver boa parte dos problemas porque as mudanças vão atingir a maioria dos trabalhadores na ativa. Dessa forma, sobra pouca gente a ser enquadrada nas regras de transição — explicou um técnico.
SÓ 20% TERÃO REGRA DE TRANSIÇÃO
Segundo dados da Pnad (IBGE), a população de até 49 anos (que atualmente contribui para o regime de aposentadoria) representa 79,7% do total. Na prática, 80% dos atuais trabalhadores terão de cumprir regras mais duras; os 20% restantes serão enquadrados na transição.
Outra questão que será enfrentada é o fim das regras diferenciadas para mulheres e professores, que hoje podem se aposentar antes dos demais trabalhadores — num prazo de 15 anos, período considerado razoável para a duração das regras de transição, a fim de segurar a trajetória explosiva do déficit da Previdência. Ou seja, se a reforma for aprovada em 2017, todos ficariam numa mesma sistemática até 2032.
Para isso, será criada uma escada que eleva progressivamente a idade de aposentadoria. No caso das trabalhadoras rurais, por exemplo, que podem se aposentar aos 55 anos, a idade mínima subiria um ano a cada oito meses, até chegar aos 65 anos. Para os professores, as regras ficariam mais apertadas para quem está enquadrado no INSS. Já para quem tem regime próprio (funcionalismo), a transição seria um pouco mais folgada, mas dentro dos 15 anos propostos.
Já existe consenso de que a vinculação do piso previdenciário ao reajuste do salário mínimo (que permite ganho real) terá de ser revista, diante do impacto nas contas da Previdência. Só falta definir se será junto com a reforma, dada a polêmica em torno da questão, ou em uma proposta à parte.
— A desvinculação está sobre a mesa. Pode ser alterada dentro da reforma ou em texto especial porque é um tema polêmico. Mas, do jeito que está não pode permanecer — disse uma alta fonte.
O discurso do governo é o de que a reforma da Previdência é inadiável, sob pena de o Brasil ser obrigado a fazer como a Grécia, que cortou benefícios de quem já estava aposentado. Se nada for feito, isso pode acontecer já próxima década, diante do tamanho da atual despesa com pagamento de aposentadorias e do rápido processo de envelhecimento da população. Em breve, o país terá menos gente trabalhando para sustentar os idosos.
De acordo com dados oficiais, a população de zero a 14 anos soma hoje 47 milhões de pessoas e, em 2060, cairá para 28 milhões — quase a metade. Já o número de idosos pulará dos atuais 16 milhões para 52 milhões no mesmo período.
Segundo um interlocutor, a reforma já está praticamente desenhada, faltando fechar apenas as mudanças no regime dos militares das Forças Armadas. O governo espera o desfecho do processo do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, para definir o melhor momento de enviar a proposta ao Congresso. Pode ser em setembro, disse uma fonte, a depender da temperatura na Casa, devido às eleições em outubro.
— Trabalhamos com a possibilidade de enviar a proposta em setembro, mas isso vai depender do clima no Congresso. Não podemos enviar com muita antecedência para evitar que as discussões se arrastem, gerando desgaste para o governo, como já aconteceu no passado — explicou um interlocutor.
A expectativa do presidente interino, Michel Temer, é que a proposta só seja aprovada no início da próxima legislatura, em 2017.
O Globo
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