Absurdo: TJ/RN paga auxílio alimentação de R$ 11,5 milhões

Dinheiro para nomear juízes é usado em pagamento de auxílio-alimentação retroativo e garante um extra per capita de R$ 52,6 mil para a maioria dos magistrados

  Magistrados ativos e aposentados do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJ-RN) tiveram um fim de ano mais “gordo” do que muitos outros servidores públicos. Por conta de um pagamento retroativo relativo ao auxílio-alimentação não recebido entre 2006 e 2011, os juízes e desembargadores ativos e aposentados consumiram mais de R$ 11,5 milhões do orçamento de dezembro de 2013 do Judiciário potiguar.

As tabelas com o detalhamento dos pagamentos feitos aos magistrados no mês passado foram divulgadas ontem. Os valores recebidos pelos magistrados da ativa variam entre R$ 2.456,66 e R$ 52.637,60, em um total de R$ 10,9 milhões. A maioria dos mais de 200 magistrados listados nos documentos do Tribunal recebeu o “teto”.

O menor valor foi pago à procuradora da República Clarisier Azevedo Cavalcante de Morais pelo período que atuou como juíza do Tribunal Regional Eleitoral do RN (TRE-RN).

Entre os inativos que receberam parte da verba estão seis juízes de terceira entrância, um juiz e dez desembargadores, dentre eles Osvaldo Soares da Cruz e Rafael Godeiro Sobrinho, condenados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) à aposentadoria compulsória por corrupção. Ambos receberam o valor máximo, que ultrapassa os R$ 52 mil.

As tabelas disponibilizadas no Portal da Transparência do TJ-RN são apresentadas como “suplementares” e os ganhos de fim de ano dos juízes e desembargadores são apresentados como “ganhos eventuais”, que vão desde antecipação de férias até gratificação natalina, passando pelos pagamentos retroativos.

Uma terceira tabela contida no site, identificada apenas como “DEA Inativos”, ainda traz mais outros pagamentos de “vantagens eventuais” de verbas de exercícios financeiros anteriores a dezembro de 2013.

Este documento inclui tanto magistrados como servidores aposentados, que receberam entre R$ 1.707,01 e R$ 18.640,91.

Procurado pela reportagem do NOVO JORNAL, o Tribunal de Justiça não emitiu qualquer declaração sobre os pagamentos até o fechamento desta matéria ou explicou quais os pagamentos relativos a esta terceira tabela.

SOBRANDO
O pagamento do auxílio-alimentação feito pelo TJ a mais de 200 magistrados em dezembro é resultado de uma ação aberta pela Associação dos Magistrados do RN (Amarn) em 2011.

O pedido da associação foi baseado na resolução 133/2011, publicada pelo CNJ no dia 21 de junho de 2011. O documento assinado pelo presidente do CNJ e ministro do Supremo Tribunal Federal Cezar Peluso, hoje aposentado, serviu para equiparar os subsídios de membros da magistratura de todo o país com as vantagens adquiridas por membros do Ministério Público Federal através de duas leis publicadas em 1993: o estatuto do Ministério Público e a Lei Orgânica Nacional do Ministério Público.

De acordo com a presidente da Amarn, juíza Hadja Rayanne de Holanda Alencar, o pagamento dos mais de R$ 11 milhões para magistrados ativos e inativos já estava previsto para ser feito a algum tempo.

A associação terminou se aproveitando da atual situação financeira do órgão judiciário para conseguir que o auxílio retroativo fosse pago.

Diante do corte de 10,74% no orçamento, decretado pelo Governo do Estado em julho do ano passado, o Tribunal passou a não poder executar plenamente alguns de seus projetos. Esta verba de “sobra” terminou sendo a recebida pelos magistrados, incluindo dinheiro que deveria ser utilizado na nomeação de juízes concursados.

“No fim do ano passado o TJ deveria ter chamado pelo menos 60 juízes, mas não teve como por conta no corte do orçamento. O dinheiro ficou sem utilização. Por isso fizemos um requerimento solicitando a quitação do pagamento retroativo. Se o valor não fosse utilizado seria devolvido para o governo”, explicou a presidente da Amarn, que também recebeu mais de R$ 52 mil no fim de 2013.

Ainda de acordo com Hadja Rayanne, desde 20111, quando o CNJ editou a resolução, vários estados realizaram o mesmo pagamento retroativo. “Todas as associações abriram ações requisitando a verba do auxílio-alimentação. Estados como São Paulo, Maranhão, Santa Catarina e Rio de Janeiro já pagaram”, destacou.

A resolução do CNJ registra que são devidas aos magistrados seis tipos de vantagens financeiras: licença não remunerada para o tratamento de assuntos particulares; licença para representação de classe; ajuda de custo para serviço fora da sede de exercício; licença remunerada para curso no exterior; indenização de férias não gozadas, por conta do trabalho, após o acúmulo de dois períodos; e o auxílio-alimentação.

No caso potiguar, o auxílio é referente ao período entre 2006 e 2011. O tempo de cinco anos requisitado para o pagamento é por conta da própria legislação, que impede que o retroativo nestes casos seja de no máximo cinco anos, a contar da abertura da ação, ou efetua-se a prescrição do valor.
Fonte: Novo Jornal, Natal-RN
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