Segundo denúncia, Adail Pinheiro oferecia dinheiro e presentes em troca de práticas sexuais com menores de idade.
O Fantástico denuncia uma vergonha nacional: um lugar onde meninas de 9
a 15 anos sofrem abusos sexuais por parte de um grupo de pedófilos que
seria liderado por um prefeito.
“Eu tinha 9 anos. E a minha mãe cozinhava no barco. Eu ficava lá
brincando, enquanto minha mãe estava trabalhando. Ele me estuprou dentro
do barco mesmo, entendeu. Eu fiquei muito apavorada, com vergonha,
nunca consegui colocar isso para fora. Hoje em dia, ele quer a minha
filha”, conta uma vítima.
“Ela tem 11 anos, então ele está destruindo a minha vida inteira,
porque aconteceu comigo, aconteceu com o meu sangue e agora ele quer a
minha filha. É monstruoso demais”.
Uma mulher conta e desenha a sua história. O caso acabou de chegar ao
Ministério Público do Amazonas. Também chegaram outros depoimentos e
vídeos.
As autoridades ficaram chocadas com as novas acusações feitas contra um
velho conhecido deles, um político que há anos é alvo de graves
denúncias de pedofilia.
O acusado pela Justiça de crimes sexuais contra menores é Adail
Pinheiro. Adail vive na mesma cidade das vítimas. Ele é prefeito de
Coari, uma cidade de 77 mil habitantes, às margens do Rio Solimões, no
interior do Amazonas. Para chegar lá, é preciso enfrentar uma viagem de
nove horas de lancha.
Coari é a segunda cidade com maior arrecadação do Amazonas. É também o
segundo município com o maior PIB do estado. Uma empresa de petróleo
instalada lá levou mais recursos para a região, mas boa parte da
população não sente os reflexos disso.
Adail é do PRP, Partido Republicano Progressista, e está no terceiro
mandato. Foi eleito pela primeira vez em 1999. Em 2008, chegou a
patrocinar o desfile de carnaval de uma escola de samba do Rio de
Janeiro. Os cariocas cantavam Coari.
E Coari, alguns meses depois, foi surpreendida por uma grande operação
da Polícia Federal. A polícia acredita que nos últimos cinco anos foram
desviados mais de R$ 49 milhões. Na época, os policiais também colheram
indícios de que o prefeito Adail Pinheiro chefiava uma rede de
exploração sexual que contava com servidores públicos para identificar e
aliciar as vítimas.
Adail chegou a ser preso. Ficou 63 dias na cadeia, mas foi solto por determinação da Justiça.
Depois de prestar depoimento em uma investigação do Senado, foi
incluído como suspeito na lista da CPI da exploração sexual infantil da
Câmara dos Deputados.
“Nós temos vários depoimentos que guardam uma coerência absolutamente
incontestável, inclusive utilizando recursos públicos para manter uma
rede de exploração sexual que ele se beneficia dela; são absolutamente
concretos e absolutamente fundamentados”, diz a presidente da CPI da
Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, Érika Kokay.
“Essa gente não sabe viver em sociedade. Essa gente tem que ser presa
para que a gente possa dar uma resposta para a sociedade e mostrar que é
possível sim se fazer justiça e desencorajar novas práticas criminosas,
principalmente essa que se pratica contra crianças indefesas”, destaca o
procurador-geral da Justiça do Amazonas, Francisco Cruz.
Setenta processos foram abertos contra Adail. Nada aconteceu com ele até agora.
“Eu não tenho nenhuma dúvida de que há uma morosidade. Nós estivemos com o presidente do Tribunal de Justiça do Amazonas. O processo estava absolutamente parado. Ele não tinha caminhado nem um passo”, destaca a presidente da CPI.
“Eu não tenho nenhuma dúvida de que há uma morosidade. Nós estivemos com o presidente do Tribunal de Justiça do Amazonas. O processo estava absolutamente parado. Ele não tinha caminhado nem um passo”, destaca a presidente da CPI.
O Conselho Nacional de Justiça está vindo nesta próxima semana para
Manaus para analisar os processos de exploração sexual, inclusive as
denúncias contra o prefeito de Coari que já foram feitas há quase seis
anos. Os conselheiros querem saber por que, apesar de tantas provas e
depoimentos, nada aconteceu com os envolvidos até agora. O Conselho
disse que vai responsabilizar os juízes e também transferir os processos
caso seja comprovada a negligência.
Fantástico: Há alguma rede de proteção ao prefeito de Coari?
“Eu não conheço. O que eu acho é que todos os processos deles estão tramitando de uma maneira muito rápida. Não há nenhuma proteção ao poder judiciário. Se eu descobrir algum lugar, alguma comarca, alguma vara, que o processo esteja paralisado a respeito desse cidadão, nós haveremos de tomar uma providência enérgica”, disse o presidente do Tribunal de Justiça do AM, Ari Moutinho.
“Eu não conheço. O que eu acho é que todos os processos deles estão tramitando de uma maneira muito rápida. Não há nenhuma proteção ao poder judiciário. Se eu descobrir algum lugar, alguma comarca, alguma vara, que o processo esteja paralisado a respeito desse cidadão, nós haveremos de tomar uma providência enérgica”, disse o presidente do Tribunal de Justiça do AM, Ari Moutinho.
Enquanto na Justiça o ritmo é lento, mais vítimas aparecem para depor
no Ministério Público. Como a mulher do início da reportagem. A filha
dela e uma parente.
“Eu quero que vocês confiem na gente, que a relação seja de confiança mesmo”, diz uma funcionária.
Fantástico: O que ele fez, exatamente?
Vítima: Passou a mão assim, depois ficou passando a mão. Depois tirou. Normal.
Fantástico: No seu seio?
Vítima: Aham. Aí botou a mão na minha cintura. Aí eu fiquei um pouquinho depois e saí.
Fantástico: Você achou estranho?
Vítima: Sim. Estranho.
Vítima: Passou a mão assim, depois ficou passando a mão. Depois tirou. Normal.
Fantástico: No seu seio?
Vítima: Aham. Aí botou a mão na minha cintura. Aí eu fiquei um pouquinho depois e saí.
Fantástico: Você achou estranho?
Vítima: Sim. Estranho.
“Ele me levou pro quarto, nossa é muito, muito. Ele me violentou, ele
me estuprou, porque eu pedi para ir embora, ele não deixou”, disse a
vítima.
Fantástico: Nessa época você tinha que idade?
Vítima:“Tinha 10 anos. Alguém, tem que parar esse cara, ele é terrível, é um doente, ele é um monstro tem que parar esse cara”.
Vítima:“Tinha 10 anos. Alguém, tem que parar esse cara, ele é terrível, é um doente, ele é um monstro tem que parar esse cara”.
A denúncia mais recente chegou ao conselho tutelar de Coari no fim de
2013: uma menina de 13 anos contou que estava sendo obrigada pela mãe a
ter relações íntimas com o prefeito em troca de dinheiro.
“A denúncia diz que ela chegou a ser levada até a residência do prefeito”, disse o conselheiro tutelar José Alberto dos Santos.
Fantástico: E ela teria que fazer o que com ele na residência?
Conselheiro tutelar: Ela teria que provavelmente ter essa relação. Uma relação íntima com ele.
Fantástico: Ele chegou a oferecer dinheiro para ela?
Conselheiro tutelar: Segundo a denúncia, houve essa questão de oferecimento de dinheiro.
Conselheiro tutelar: Ela teria que provavelmente ter essa relação. Uma relação íntima com ele.
Fantástico: Ele chegou a oferecer dinheiro para ela?
Conselheiro tutelar: Segundo a denúncia, houve essa questão de oferecimento de dinheiro.
José Alberto chegou a gravar em vídeo o depoimento.
Vítima: O que eu faço? Ninguém consegue me responder. O
único jeito é perder minha virgindade. Ele sugeriu R$ 2 mil por cada
menina se eu levasse.
Conselheiro Tutelar:“Você ganhava R$ 2 mil?
Vítima: Por cada menina. Contando que seja virgem. Ele quer menina e tem que ser só virgem. Eu estou me sentindo triste porque eu não quero fazer isso.
Conselheiro Tutelar:“Você ganhava R$ 2 mil?
Vítima: Por cada menina. Contando que seja virgem. Ele quer menina e tem que ser só virgem. Eu estou me sentindo triste porque eu não quero fazer isso.
A menina, virgem, de apenas 13 anos, foi prometida ao prefeito para a noite do último Réveillon.
“Você vê a que ponto se chegou. Você ter a virgindade oferecida por uma
autoridade como brinde do Ano Novo”, disse o procurador.
Não houve o encontro. Dias antes da virada do ano, a garota decidiu
sair da cidade e foi para casa de parentes em Manaus. Ela contou para
uma amiga que foi espancada pela mãe.
“Inclusive eu vi os hematomas. Por ela não ter ido. Ficava tratando ela
com indiferença. Entendeu? Para que ela fosse”, conta a amiga.
Em outro vídeo conseguido com exclusividade pelo Fantástico, um
ex-motorista da prefeitura, Osglébio da Gama, conhecido como Canarana,
conta qual o pagamento as meninas recebiam, depois do encontro íntimo
com o prefeito.
“Foi dado muita coisa para ela, comprado muita coisa: máquina, celular
caro, um monte de coisa foi comprado em meu nome e dado para ela. Quem
dava era eu para ela. Sempre eu levava para ela dinheiro: R$ 5 mil, R$ 6
mil”, conta.
“É porque o Adail é doente. Ele é doente. Ele não é um cara assim de
tesão. Porque nós vemos uma mulher bonita, a gente fala: 'olha aquela
gata ali'. Ele não, é carne de pescoço para ele. Ele quer saber daquelas
menininhas novas”, destaca o ex-motorista.
A equipe do Fantástico telefonou para o ex-funcionário que aliciava as
meninas para o prefeito. “No momento eu estou viajando. Eu não tenho
nada a declarar”.
“As práticas são sempre as mesmas. Troca-se dinheiro. Algumas vezes,
tratamento de saúde, residência para os familiares. Ou seja: é uma
compra”, disse o procurador.
O prefeito Adail Pinheiro ficou de receber a equipe do Fantástico no
escritório do advogado dele em Manaus. Ele daria uma entrevista para a
gente, mas na última hora desistiu. Quem recebeu a nossa equipe foi o
advogado de Adail.
Fantástico: O prefeito Adail é inocente em relação à essas acusações de exploração sexual?
Advogado: Acredito que sim.
Fantástico: Ele chegou a ameaçar alguma vítima, pediu para que algum funcionário ameaçasse alguma vítima?
Advogado: Pelo que eu conheço o prefeito Adail, não é o perfil dele. O que eu vejo em Coari é uma oposição política em relação ao prefeito Adail, muito forte nesse sentido, de fomentar esse tipo de notícia e informação.
Advogado: Acredito que sim.
Fantástico: Ele chegou a ameaçar alguma vítima, pediu para que algum funcionário ameaçasse alguma vítima?
Advogado: Pelo que eu conheço o prefeito Adail, não é o perfil dele. O que eu vejo em Coari é uma oposição política em relação ao prefeito Adail, muito forte nesse sentido, de fomentar esse tipo de notícia e informação.
Mas as justiças federal e estadual têm muitos elementos para
incriminá-lo. “As informações são contundentes. Nós estamos fazendo a
coleta desse material para que a gente possa instruir e propor uma ação
penal no futuro”, disse o procurador.
“Ele se diz muito poderoso, ele persegue, ele oprime e ele obriga a
fazer o que ele quer, senão você não tem p\ra onde ir, você morre de
fome e você sai da cidade”, conta a vítima.
“Acabou o sorriso, acaba a sua vida, tudo, tu não tem mais vida, e hoje
eu estou tendo oportunidade de pôr para fora o que eu estou sentindo,
que eu escondi esse tempo todo por medo. Eu não quero ser só mais uma
pessoa falando, pedindo socorro e nada acontecer”, disse outra vítima.
Fonte: G1