A lorota da traição: argumento para o rompimento camufla pressão no PT pela candidatura de Fátima Bezerra ao governo do RN

A política, disse certa vez um velho mas atual florentino, deve ser analisada a partir dos acontecimentos concretos e dos objetivos em jogo. Constitui um erro de partida se enredar naquilo que os agentes em disputa utilizam como camuflagem discursiva para os seus reais interesses. Nessa perspectiva, o rompimento do PT com o governo Robinson Faria só pode ser entendido, se for levado em conta os eventos dos últimos meses do ponto de vista eminentemente potiguar. 

No jardim da infância talvez seja possível encontrar quem acredite na justificativa apresentada pelo Partido dos Trabalhadores para sair da base de Robinson. A alegação de que o PT passará a fazer oposição ao Governo do Estado porque o deputado federal Fabio Faria seguiu a orientação nacional de sua agremiação é bisonha.

A coerência propalada pelos petistas, se for seguida à risca, colocará os ditos cujos na possibilidade de fazer aliança apenas com o PDT, PSOL e PCdoB, únicas agremiações na Câmara que deliberaram contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Só para se ter ideia de como cair nesta explicação constitui uma ingenuidade, a senadora Fátima Bezerra teria de romper com prefeitos do DEM e do PMDB que a apoiaram no pleito de 2014. Fará? Nas poucas prefeituras que controla, o PT deveria pedir o rompimento dos seus gestores com o PMDB, PP, PR, PSD, DEM, PSDB, PP, PTN e outras siglas. Fará? A tentativa de criar um argumento verticalizador, que junta o local, o estadual e o nacional, é inviável num sistema multipartidário. Tanto que o PCdoB, sempre próximo ao PT e árduo defensor de Dilma, resolveu manter a aliança estadual com o PSD (aliás, a dita coerência de ocasião petista é sim aplicada: pelo PSTU e o PCO). 

A utilização dessa retórica serve, na verdade, para esconder os fatos que cercaram o desenrolar do tabuleiro político potiguar e a forma como o PT se inseriu nele. Não é segredo para mais ninguém que a senadora será candidata ao pleito de 2018. Já afastada do Governo, pelos cargos perdidos até ontem para o seu detrator, pressionava o PT de Fernando Mineiro nos bastidores para que ele saísse da gestão de Robinson Faria. Muito bem alojado com seis secretarias e algumas centenas de cargos, ele resistia. As pastas estavam servindo muito bem para o grupo de Mineiro viabilizar candidaturas no pleito que se avizinha. Porém, a situação estava se tornando insustentável. A pecha de "fisiológico" trabalhada internamente pelo grupo de Fátima contra Mineiro ganhava corpo.

Fernando Mineiro deixou claro em diversas oportunidades que lidera o PT no RN (tanto que a ação do partido foi antecipada por uma reles twittada pessoal dele. Logo em seguida, esquecendo a conversa da democracia interna, o diretório referendou a ação à unanimidade. Isto em menos de 24 horas). Ainda assim, Mineiro não teria como negar a candidatura de Fátima Bezerra. A militância, que segura a bandeira e torna o custo das campanhas petistas menos salgado, jamais aceitaria o partido rechaçar a sua senadora, para ficar com Robinson Faria. Como então sair sem deixar a marca para o Rio Grande do Norte do "oportunismo"? Era preciso uma desculpa que colasse.

O PT não tinha do que reclamar. Recebeu muito mais do que a força política representada. A sinuca de bico tinha uma saída em processo de articulação, mas transformada numa opera bufa. Quem lê este blog já sabia que a ideia de Fernando Mineiro, conforme já se comentava dentro do partido, era deixar o governo, após Robinson Faria lhe negar o apoio a sua postulação para concorrer a prefeitura do Natal. Mineiro alegaria falta de reciprocidade e ficaria na confortável posição de vítima. Só que Robinson, mesmo tendo uma montanha de evidências de que a candidatura de Mineiro não tem qualquer chance, preferiu, para não emprestar o discurso aos petistas, não lançar nenhum nome oficialmente em Natal. Assim, o PT teria de sambar bastante para fundamentar sua saída e lançar, após pedir voto, ocupar centenas de cargos e ter o próprio Mineiro como líder do governo na Assembleia, o nome da senadora contra Robinson Faria.

A votação do impeachment, nesse sentido, caiu como uma luva. Isolado nacionalmente, mas nem por isso deixando de ambicionar o governo do RN, utilizaram Fabio Faria, filho de Robinson Faria, mas quem tem compromisso com o PSD, como bode expiatório. Portanto, a lorota da "traição" alastrada pelos petistas esconde nome, objetivo e está com um olho enorme na máquina estadual. E mais: a partir de segunda trabalhará sem tréguas contra o governo. De que modo? Bom prestar atenção nos sindicatos, verdadeiras armas de combate do PT no RN. Até papel higiênico vencido virará motivo para paralisação. Robinson Faria não terá mais paz com eles.

A embalagem jogada pelos petistas tenta retirar de cena os ingredientes listados acima. O resto é só conversa mole para boi dormir.
Fonte: O Potiguar
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