Por Carlos Chagas
Ricardo Lewandowski, quando atuou no processo do mensalão, bateu de
frente com o relator, Joaquim Barbosa, perdendo a simpatia da opinião
pública e da opinião publicada. O país inteiro torcia pela condenação
dos réus. Mesmo assim, todos reconheceram estar o ministro-revisor no
direito inalienável de expor suas concepções, ainda que acusado de ser
advogado de defesa dos mensaleiros.
Conduzido outra vez ao centro do palco das atenções gerais, ontem,
Lewandowski deu nova demonstração de que gosta de remar contra a maré.
Só que sua canoa virou. Não dá para entender como proibiu populares,
advogados, a imprensa e a própria TV-Justiça de assistir e registrar o
depoimento do deputado-pastor Marco Feliciano, acusado de estelionato e
de induzir à discriminação e ao preconceito de raça.
A
desculpa do magistrado foi de que a sala onde seria prestado o
depoimento era pequena demais, podendo verificar-se tumulto e confusão.
Argumentos pueris para quem constata serem mais do que amplas as
instalações do Supremo Tribunal Federal. Se a sala designada
mostrava-se insuficiente, nada mais natural do que requisitar outra,
maior e capaz de abrigar quantos pretendessem estar presentes. Pior fica
alegar o risco de confusão e tumulto, ignorando a existência dos
numerosos agentes de segurança encarregados de zelar pelo bom andamento
dos trabalhos judiciários.
Lewandowski igualou-se ao depoente, que ainda esta semana fechou as
portas da Comissão dos Direitos Humanos, deixando o povo de fora na casa
do povo. Deu a impressão de ser o Supremo um acanhado quarto e sala
onde não cabe ninguém.
Com
todo o respeito, será a compulsão de proteger bandidos? O desprezo pelas
manifestações da sociedade? A concepção de superioridade frente ao
direito de informação? Tanto faz, pois o vice-presidente da mais alta
corte nacional de Justiça não desperdiçou a oportunidade de revelar-se
de forma negativa diante do país. Marco Feliciano está cada vez mais
esperançoso de sair absolvido do processo a que responde.
A ÚLTIMA OPORTUNIDADE
Terça-feira a Câmara dos Deputados irá defrontar-se com a derradeira
oportunidade de avançar no debate para a aprovação da reforma
política, defendida por todo mundo mas até agora transformada em sonho
de noite de verão. Na realidade, são os políticos que a protelam e
renegam, apesar das aparências. Também, seriam os mais prejudicados com
as mudanças propostas.
O
financiamento público das campanhas eleitorais é a primeira reforma em
pauta, com ou sem a proibição das doações particulares. De qualquer
forma, será impossível impedir os doadores e os candidatos de
continuarem manipulando recursos fora dos cofres públicos. Aliás, fica
difícil ao cidadão comum aceitar a falta de dinheiro para escolas,
hospitais, segurança pública e infra-estrutura, em paralelo à liberação
de centenas de milhões para eleições.
A
proliferação de partidos, inclusive os de aluguel, que vendem tempo de
televisão, deveria ser impedida com a reforma política. Deveria mas não
será. Primeiro porque existem as pequenas legendas históricas,
honestas, que também desapareceriam. Depois, porque interessa aos
grandes partidos dispor dessas linhas auxiliares.
Proibir coligações partidárias nas eleições proporcionais? Dificilmente,
porque elas são responsáveis pela presença de ampla maioria de
deputados com muito menos votos do que candidatos derrotados. Injustiças
flagrantes tem sido toleradas e praticadas em detrimento da vontade do
eleitor, sendo por conta de sua continuação que a proposta acabará
rejeitada.
Substituir o voto no candidato determinado pelo voto na legenda, em
listas partidárias elaboradas pelos partidos, nas eleições para a
Câmara dos Deputados, as Assembléias e as Câmaras de Vereadores? Seria a
felicidade dos caciques partidários sem voto nem prestígio, mas com
comando. Eles se colocariam nos primeiros lugares, impedindo a
renovação. Acresce carecerem os partidos de ideologia e até de doutrina,
igualando-se todos. O eleitor, fora as exceções de sempre, ignora ou
confunde-se com o grande número de siglas que nada representam.
Não
há quem defenda a existência de montes de senadores sem voto, os
suplentes, não raro superiores a 30% do Senado. Eles assumem pela
ausência do titular, muitas vezes através de combinações meio malandras,
pois o suplente sempre é parente ou forte doador da campanha. Só que
não representam o eleitor, que nem os conhece. O ideal seria, no caso de
impedimento definitivo do senador, que novas eleições se realizassem, a
qualquer tempo e hora. E que nas ausências eventuais, não fosse
substituído. Acabaria o rodízio de nulidades, mas quantos senadores
aprovariam a supressão? Talvez nenhum.
A lei
já proíbe o troca-troca de partidos, mas tendo deixado sempre uma
janela aberta para Suas Excelências mudarem de legenda ao menor sinal de
interesses contrariados, sem qualquer relação com ideologias ou
doutrinas. Mesmo que tornada mais drástica a proibição, jamais deixará
de existir a janela, ou um alçapão, para permitir que conservadores se
tornem socialistas, ou vice-versa, com todas as combinações possíveis.
Falou-se muito na adoção do voto distrital, capaz de permitir maior
proximidade entre o eleitor e o eleito, mas o perigo será de facilitar a
compra de votos, sendo os distritos bem menores do que os estados, no
caso das eleições para deputado federal e estadual. A maioria
parlamentar rejeita a possibilidade.
Por
fim, a extinção do princípio da reeleição para cargos executivos. Foi
comprada no Congresso a possibilidade de um presidente da Republica,
governador e prefeito disputarem um segundo mandato no exercício do
primeiro, em pleno exercício do poder. Fernando Henrique Cardoso, como
comprador, que o diga. Só que a moda pegou e todos gostaram, ainda mais
sem necessidade da desincompatibilização para a reeleição. Não passa
de jeito nenhum a supressão dessa prerrogativa, mesmo se incluída nela
a extensão dos mandatos executivos de quatro para cinco ou seis anos.
Oito é melhor...
Fonte: Cláudio Humberto