Por Carlos Chagas
O bate cabeça entre PT e PMDB vem de muito tempo, mas agora piorou.
Entre os companheiros, a maioria sustenta que os aliados devem ser
levados a definir-se de imediato: ou ficam e votam com o governo, no
Congresso, ou saltam de banda, entregando seus ministérios. O que não dá
é para o PMDB ficar exigindo o sacrifício de candidatos do PT aos
governos estaduais sem a óbvia correspondência numa série de estados.
Os problemas da presidente Dilma não se limitam ao mau
relacionamento dos dois maiores partidos de sua base. Os reclamos contra
o governo avolumam-se no próprio PT, com boa parte de seus
parlamentares culpando ministros e a própria presidente pela falta de
unidade de comando político. Sendo 2014 ano de eleições gerais, a
previsão é de que a temperatura vai subir ainda mais. Os petistas estão
percebendo a possibilidade de eleger menores bancadas que as atuais,
caso não disponham de um entrosamento perfeito com o palácio do
Planalto.
Indaga-se da possibilidade de um refluxo da crise, duvidando-se de
que o ex-presidente Lula disponha de condições para dar ordem unida no
seu partido. No caso, apenas a presidente Dilma seria capaz de
restabelecer a paz, na hipótese de arregaçar as mangas e dedicar-se a
aparar as arestas. Como?
Primeiro dispensando a ministra da Coordenação Política, Ideli
Salvatti. Depois, limitando a chefe da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, a
tratar de assuntos administrativos, sem ingerência nos assuntos
políticos. Em seguida, pedindo às suas bancadas a indicação de um nome
para exercer ao mesmo tempo o ministério da Coordenação Política e a
liderança na Câmara, em linha direta com a presidente.
A pergunta é se Dilma estaria disposta a dividir seu tempo entre a
administração e a política. Parece que não. Nunca foi de seu estilo
receber e dialogar com deputados e senadores, enfrentando pedidos e
reivindicações de toda ordem. Por isso estimula a intermediação das
duas ministras.
CONTRA A LÓGICA
Fica difícil entender porque o Congresso admitiu cercear o Ministério
Público, atendendo a pretensão dos delegados de polícia de excluir
promotores e procuradores de investigações criminais. Deveria prevalecer
a regra básica, de que quanto mais investigações de um crime, maiores
condições existiriam para sua apuração e a punição dos criminosos. Numa
época em que tanto se combate a tal reserva de mercado, deputados e
senadores trafegam na contra-mão. As prerrogativas dos delegados são
irremovíveis.
PIOR SE DER CERTO
No final da guerra do Pacífico, com o Japão derrotado e as tropas
americanas preparando o que seria a mais formidável invasão de um país,
imaginando-se quantos jovens americanos seriam mortos ou feridos, o
recém-empossado presidente Harry Truman autorizou o uso da bomba
atômica. Poupou a vida de centenas de milhares de soldados americanos,
ainda que às custas do sacrifício de civis japoneses, em especial
crianças, mulheres e velhos.
Perguntaram ao general MacArthur, comandante em chefe que liderava
os preparativos da invasão, o que aconteceria caso o lançamento da bomba
não desse certo. Irritado, ele respondeu estar muito mais preocupado se
a bomba desse certo…
É essa a expectativa que cerca a sucessão presidencial do ano que vem. E se a reeleição da presidente Dilma der certo?
SOBERBA, PRESUNÇÃO E IGNORÂNCIA
Faltando três dias para a inauguração oficial do estádio do Maracanã,
completamente remodelado, um promotor público pede sua interdição e a
suspensão da partida anunciada entre as seleções do Brasil e da
Inglaterra. Uma juíza concede a liminar, na tarde do feriado religioso
de ontem, para valer no domingo. Convenhamos, se era para aparecer,
melhor teriam feito a juíza e o promotor se pendurassem melancias no
pescoço. Não se preocuparam com a repercussão de suas iniciativas no
universo do coletivo nacional. Certamente ignoraram os debates do
processo do mensalão, onde prevaleceu a teoria do domínio do fato.
Claro que a CBF, como sempre, incorreu em monumentais irregularidades. O
governo do Rio de Janeiro, também. Acrescente-se outras entidades. Mas
imaginar-se acima dos valores da sociedade, dando de ombros para o risco
de frustrar milhares de espectadores na antiga capital, milhões de
telespectadores no país inteiro, para não falar no planeta, foi
demonstração de soberba, arrogância e megalomania. Dois cidadãos, por
maior cultura jurídica de que disponham, não podem desafiar a alma
nacional, da qual o futebol faz parte. Seria o mesmo de que por conta
do aumento de crimes durante o Carnaval, proibissem o desfile das
Escolas de Samba, através de uma liminar. Ou porque existem padres
pedófilos, impedir as crianças de ir à missa.
O Ministério Público e o Judiciário teriam outras formas para punir a
desídia das autoridades esportivas. Preventivamente, estabelecendo
multas e até prisão para os responsáveis pela entrega incompleta do
estádio. Com muito mais veemência e inflexibilidade caso se
verificassem, durante a partida, confrontos causadores de acidentes
maiores e menores. Suspender o espetáculo, porém, cujos riscos se
debitariam a seus organizadores, significou investir contra o sentimento
popular.
Felizmente, liminares concedidas na primeira instância do judiciário
costumam ser revistas e cassadas nos tribunais. Pode ser que hoje,
sexta-feira, tudo não tenha passado de um pesadelo, e que a juíza e o
promotor tenham retornado ao anonimato de onde jamais deveriam ter
saído, por decisão de algum desembargador. Claro que com a severa
responsabilização das autoridades que deixaram de cumprir suas
obrigações. Até dos empreiteiros que não retiraram o entulho das obras
conforme o contratado.
Nesse episódio de horror ainda inconcluso, a ironia ficou com a
equipe inglesa, já desembarcada no Brasil: “Se não tiver estádio,
jogaremos na praia de Copacabana”…