O POVO E A REFORMA POLÍTICA

Por Carlos Chagas


                                                                             
É preciso  coragem para reconhecer que o povo não está nem aí para a reforma política. Proibir coligações partidárias, reduzir o número de partidos, votar para deputado  em listas preparadas pelos partidos, acabar com os suplentes de senador, estabelecer o voto distrital, determinar o financiamento público das campanhas – essas e outras alterações na legislação podem interessar às elites, mesmo assim de forma parcial. O povão, quer dizer, o trabalhador, o estudante, o baixo assalariado,  não se interessam  por esses detalhes. Talvez nem os jovens que vem saindo às ruas para protestar, porque eles protestam por valores muito mais concretos: o funcionamento dos serviços públicos, dos hospitais, das escolas e universidades, o preço das passagens nos transportes coletivos, a necessidade de se acabar com a corrupção, a importância de botar os corruptos na cadeia, a  abertura de novos empregos, a contenção  do custo de vida e demais reivindicações ligadas ao dia-a-dia de cada um.
                                                                              Levanta-se  uma espécie de cortina-de-fumaça  manipulada pelas elites, a começar pela presidente Dilma, o Congresso e os meios de comunicação, como se a reforma política se encontrasse em pé de igualdade com as  carências que tem levado multidões a quebrar a rotina de vida no país inteiro. Muito mais importante, para elas, foi  a redução das tarifas de ônibus e metrôs,  como tem sido as promessas de melhoria da prestação de serviços nos hospitais,  escolas públicas, rodoviárias e aeroportos. Claro que também fundamental para   o grito de revolta nacional inclui os gastos com a Copa das Confederações e a Copa do Mundo.  Mas  reforma política?... 


BALANÇO AINDA IMPOSSÍVEL
                                                                             
Nas lojas comerciais de antigamente aproveitava-se o final do ano para os tradicionais “balanços”. Não raro eram suspensas as atividades normais, até  o  relacionamento com o público, de forma a se recontar tudo o que permanecia nas prateleiras, assinalando-se seus devidos valores. Entre o que foi comprado  e o que foi vendido, o que foi  pago e o que foi recebido, verificava-se ter a empresa dado lucro ou prejuízo.  Hoje os computadores fazem tudo, dia a dia, permitindo conhecer movimento e resultados na hora mesmo em que se realizam.
                                                                             
O preâmbulo se faz a respeito das manifestações populares verificadas no país inteiro. É cedo para um balanço, pode-se no máximo colher pelos telejornais da noite ou os jornais do dia seguinte uma relação do que aconteceu. Quantas passeatas pacíficas  de protesto, onde houve depredação e vandalismo, como se comportaram as  polícias militares, o número de feridos, até de mortos, o prejuízo dos estabelecimentos privados e de propriedades públicas. 
                                                                             
Agora, saber se é positivo ou não o saldo do movimento, só mesmo com um balanço no final de tudo, portanto  ainda impossível de ser efetuado, já que as manifestações parecem longe  de terminar. As votações meteóricas e surpreendentes, no Congresso, engrossam a coluna do “haver”,  mas o que dizer da ação dos animais que aproveitam para assaltar, invadir e furtar? Ou dos efeitos das balas de borracha, dos sprays de pimenta, do gás lacrimogêneo ou das pedras, bolas de gude e petardos de toda espécie que cruzam praças, ruas e avenidas?
                                                                              Traduzindo: por enquanto não dá para  saber o resultado final dessa convulsão  que nos cerca.  Boa porque exprime participação popular  e pressão sobre instituições antes entregues ao marasmo. Má porque trás em seu bojo oportunidades amplas para a prática de crimes explícitos.
                                                                             
A conclusão é de que as manifestações das últimas três semanas mexeram com o Brasil inteiro. Do real ao formal. Quanto às consequências, será bom aguardar. 
AnteriorPagina Anterior ProximaProxima Pagina Página inicial