Por Carlos Chagas
Há tempos que se cobrava de Aécio Neves um pronunciamento amplo e
profundo, de candidato para valer, capaz de mostrar-se como tal,
abordando problemas e soluções nacionais de curto e de longo prazo.
Apesar de haver assumido a presidência do PSDB e destacando-se como o
futuro indicado pelos tucanos à presidência da República, o senador
mantinha-se numa zona de cautela. Fazia críticas ao governo, duras e
respeitosas, mas continuava devendo um plano de vôo para maiores
alturas.
Não deve mais. Seu discurso na tarde de terça-feira, em nome das
oposições, preencheu com folga as expectativas de quantos aguardavam a
presença, no ringue, de um contendor capaz de enfrentar Dilma Rousseff e
a reeleição. Falou por conta da crise gerada pelas manifestações de rua
e a necessidade de o Congresso e os partidos responderem aos
clamores, reclamos e protestos da população.
Foi duro ao comentar a fala da presidente da República, feita na
véspera. Para ele, o país ouviu o mesmo monólogo de sempre: “assistimos o
Brasil Velho tentando ser ouvido pelo Brasil Novo, com o governo
buscando terceirizar as dificuldades que ele mesmo criou”.
Aécio lembrou que até pouco nenhum governo havia disposto de tanto
apoio popular e parlamentar. Por isso, ficou frustrado com as propostas
de Dilma para superar a crise. Num momento como o atual, julgava
impensável que as oposições não tivessem sido convocadas. Sua voz teria
que ser ouvida antes da apresentação das medidas unilaterais do
governo. “Não tivemos o privilégio de ser convocados”, queixou-se sem
fechar as portas ao chamamento que veio depois, estando marcada para
segunda-feira a ida dos tucanos ao Planalto. Citou Ulysses Guimarães
para reclamar um novo pacto federativo: “Ninguém mora na União, nem no
Estado. Mora-se no Município.”
Seguiu-se a apresentação de um elenco de iniciativas que o PSDB teria
levado pessoalmente a Dilma, mas seria naquele momento divulgado pela
tribuna do Senado.
Obrigatoriedade de ficha-limpa para a ocupação de qualquer cargo no
serviço público. Extinção dos cartões corporativos para funcionários
públicos. Apuração de todos os gastos do governo com a Copa das
Confederações e a Copa do Mundo. Explicações da presidente Dilma sobre
ter inaugurado tantos estádios, se agora afirma terem sido todos apenas
financiados pelo BNDES, mas que os empréstimos serão pagos. Saber,
também, quais os gastos de empresas brasileiras no exterior, a começar
pela aquisição, pela Petrobrás, de uma refinaria falida em Passadena,
Estados Unidos, a preços muito superiores aos do mercado.
“Para acreditarmos nas boas intenções da presidente – continuou Aécio
– seria necessário um gesto simbólico por parte dela. Por que não
reduzir pela metade o número de ministérios? Por que não cortar parte
dos 22 mil cargos comissionados do Executivo, preenchidos pelo PT? A
revisão das dívidas dos Estados é imprescindível, bem como a
participação dos Estados na aplicação de pelo menos 50% daquilo que
pagam à União. Tolerância zero com a inflação. Nível mínimo para as
despesas públicas. Conclusão de todas as obras viárias ligadas à Copa do
Mundo. Arquivamento do plano mirabolante do trem-bala e utilização de
seus recursos na recuperação da malha ferroviária nacional. Revisão do
investimento mínimo na saúde pública, com sua ampliação através de
recursos dos royalties do petróleo, com a óbvia prevalência para a
educação. Recuperação das Santas Casas da Misericórdia, em estado
falimentar em todo o país. Desoneração das empresas dedicadas ao
saneamento básico.”
Entre essas, outras propostas foram alinhadas pelo ex-governador de
Minas, numa espécie de pré-plano de governo, ainda que oferecido como
colaboração com a presidente Dilma Rousseff. No encerramento, clamou
pela rejeição da PEC-37, sepultada no dia seguinte pela Câmara, assim
como rotulou de vocação para o suicídio a proposta também depois
abandonada, da Assembléia Constituinte exclusiva.
Em suma, o senador Aécio Neves discursou pelaprimeira vez como
candidato assumido, recebendo apoio dos correligionários e elogios de
adversários.
A PÁTRIA MUDA NÃO MUDA
Causou profunda impressão entre os políticos a frase simples
estampada na camiseta de uma menina de 20 anos, uma das líderes dos
movimentos de protesto: “A PÁTRIA MUDA NÃO MUDA”. Um simples slogan
exprime a causa primeira de todas as manifestações de rua, exceção, é
claro, da ação dos vândalos que continuam saqueando o comércio e
propriedades públicas.
INTRANQÜILIDADE
Se faltasse um argumento a mais para sepultar a esdrúxula proposta da
convocação de uma Assembléia Constituinte exclusiva, bastaria atentar
para lembranças do historiador Ronaldo Costa Couto, ex-chefe da Casa
Civil e ministro do governo José Sarney. Para ele, a intranqüilidade
econômica alcançou seus pontos mais altos quando da convocação da
Constituinte em 1987, pelo então presidente da República. Da noite para o
dia interromperam-se os investimentos externos, empresas estrangeiras
retiraram-se do país e todo mundo temia o desconhecido. Porque uma
Constituinte, mesmo sob o rótulo de exclusiva, pode muito. É capaz de
desestabilizar as instituições. Não foi o que aconteceu com a carta de
1988, mas temores se multiplicaram. Um grupo até queria cassar o mandato
de Sarney.
MINAS E AS REVOLUÇÕES
Tancredo Neves manteve firme oposição ao regime militar e costumava
comentar que a História sempre reservava para Minas a primazia de nossas
revoluções, “tanto as boas quanto as más”...
Fonte: claudiohumberto.com.br